O primeiro livro de Imbolo Mbue, 36 anos, chega no momento oportuno e fazendo barulho: em 2014, ele foi comprado por uma soma de sete dígitos em Frankfurt, e no ano seguinte seus direitos foram vendidos para o cinema com o mesmo bafafá. Aqui Estão Os Sonhadores, que chega ao Brasil em edição da Globo Livros, conta a história de duas famílias durante a explosão da bolha financeira de 2008 em Wall Street: uma de camaroneses tentando se estabelecer em Nova York (cidade em que a escritora vive há 18 anos), e outra de norte-americanos brancos e ricos, lidando com as consequências da crise.

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O grande triunfo do romance é humanizar essas relações e colocá-las no mesmo pedestal, o que o faz, segundo a própria autora, um livro mais sobre famílias do que propriamente sobre imigração. Mbue conversou com o Estado por telefone.

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Mesmo com um grande sentimento de aflição o tempo todo, o livro parece nunca perder um senso de otimismo. Como?

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Tem a ver com os personagens. Essa atitude faz parte da nossa cultura. As pessoas (de partes da África) encontram jeitos de serem alegres e felizes com coisas que não estão indo tão bem. Esse sentido de tentar se manter e ainda não ficar todo deprimido… quer dizer, nós realmente sofremos, mas os camaroneses têm uma atitude mais positiva, sim.

O “sonho americano” está se perdendo?

Não sou grande fã da ideia toda do “American Dream”. Você vem aqui, trabalha e tem uma vida boa… Eu vi muita desigualdade nesse país. Os outros países também têm, mas essa coisa de que todo mundo tem uma chance igual não é o caso. Temos recessão, preconceitos, e enquanto a América foi um grande país para mim em vários sentidos, eu ainda vivi muitas dessas desvantagens. Eu sei que pessoas virão para cá com o American Dream na cabeça, mas e se ganharem dois dólares por hora? Como alguém vai comprar uma casa com dois dólares por hora?

Críticos disseram que seu livro é tanto um romance americano quanto um romance africano. Como você vê?

É engraçado. Eu sou muito africana, orgulhosa disso, mas também sou muito americana. Eu nasci lá, mas vivi aqui metade da vida, tenho um jeito americano de pensar. Esse livro é inspirado pelo meu tempo na América, vivendo em Nova York passando por esse período de recessão.

Nesse sentido, é um romance americano. Mas também é um romance africano porque é uma grande celebração da minha cultura africana. É estranho ter que decidir.

A imigração foi um dos principais temas das eleições americanas recentes. Por que você acha que isso aconteceu?

O país precisa de reformas de imigração. Há 11 milhões sem documentos legais, e muitos são trabalhadores com grande chance de contribuir para o país e viver nele. Há essa retórica de que “estão roubando nossos empregos”, eu não entendo isso. Fico preocupada com pessoas sendo transformadas em vilãs, e toda essa negatividade. Quando eu vim, a América era um lugar mais acolhedor. Mas muitas coisas aconteceram… o onze de setembro, a recessão. Tem muito a ver com o American Dream, as pessoas parece que começaram a perceber que ele estava em perigo. Trump veio e disse coisas que as pessoas queriam ouvir. É o que os políticos fazem. Tem muito a ver com emoções.

Qual o sentimento geral por aí?

Fiquei desapontada com a eleição. Mas quero ser otimista. Há alguma fé por aqui. Vou manter meus olhos abertos. Nós não vamos só sentar e esperar, vamos nos engajar, estamos todos querendo que o país se mova na direção certa.

AQUI ESTÃO OS SONHADORES

Autora: Imbolo Mbue

Tradutor: George Schlesinger

Editora: Globo Livros (424 págs., R$49,90) Fonte: Dow Jones Newswires.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.