Talvez você não tenha reparado direito, mas muitos dos livros que você já leu, inclusive aqueles solicitados no vestibular, apresentam trechos eróticos. Seja em Machado de Assis ou em Moacyr Scliar, de Olavo Bilac a Lygia Fagundes Telles, de Carlos Drummond de Andrade a Dalton Trevisan; todos têm trechos (ou obras inteiras) eróticas. Mas se a sexualidade está tão presente na vida de todos, porque tanto tabu para falar disso?
Tem gente que já perdeu esse tabu faz tempo (ou nunca teve). Uma delas é a professora de Literatura Brasileira da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Eliane Robert de Moraes, que há muitos anos se dedica a estudar e analisar tais obras. Não, Eliane não é escritora, apenas faz críticas literárias. Ela explica que o erotismo está presente na vida de todos, seja em casal, com pessoa de sexo diferente, do mesmo sexo, sozinha ou em grupo.
“Então por que a literatura não pode participar disso? Temos tantos preconceitos morais que esquecemos que um livro erótico é literatura. O texto pode ser obsceno, mas é uma excelente leitura. Temos que separar o joio do trigo. Aceitar uma obscenidade, desde que nela exista um bom texto. Não é perversão. É literatura”, defende Elaine, que, nesta quarta-feira (23), estará participando da Terceira Festa Literária da Biblioteca Pública do Paraná, a Flibi, lendo trechos dos livros do curitibano Dalton Trevisan, ressaltando o erotismo das obras dele. A Flibi começou nesta terça-feira (22) e vai até sábado (26) e, pela primeira vez, extrapola as paredes da biblioteca. Haverá atividades externas (na Praça 29 de Março) e em outras cinco cidades paranaenses.
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Mal escrito
Quando se fala em obra erótica, todo mundo lembra de Cinquenta Tons de Cinza. O livro, da autora britânica E. L. James, foi lançado em 2012, mas explodiu quando o filme homônimo foi lançado, em 2015. Eliane acha válida a luz que o filme lançou sobre a literatura erótica, pois fez as pessoas se aproximarem mais deste tipo de leitura. No entanto, critica ferrenhamente a obra. “É um livro mal escrito, que usa muitos clichês, a história da moça bonitinha que conhece o milionário. Já no primeiro encontro deles, ela tropeça e cai aos pés dele. É tanto clichê que você já sabe o que vem em seguida. Não há preocupação com a forma literária. É muito comercial”, defende Eliane.
Para ela, uma boa obra literária erótica é aquela que te surpreende, perturba, mexe com o seu interior e te coloca alguma questão para pensar. “Não sou contra só contar histórias, consumir obras que sejam apenas entretenimento. Eu assisto novela, vejo seriados. Mas é diferente de você assistir um filme do (Federico) Fellini, por exemplo, que te tira do lugar comum, da zona de conforto. As obras literárias são ferramentas que nos ajudam a pensar, ter uma visão crítica de mundo. É diferente de você consumir apenas uma história e ter uma visão conformada da história. Arte serve pra isso, nos dá essa ferramenta simbólica para pensar na nossa vida, na vida coletiva”, diz Eliane, explicando porque considera Cinquenta Tons um livro raso e mal escrito.
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Indicações de quem entende
Você quer entender um pouquinho mais sobre literatura erótica? A Eliane estará às 19h desta quarta-feira (23) na Biblioteca Pública do Paraná, com o painel “Essas Malditas Mulheres: o feminino e o erotismo na ficção de Dalton Trevisan”. No bate papo, mediado por Luci Collin, ela vai falar sobre essa constante erótica nos livros do autor curitibano. Você não poderá ir? Não tem problema! A Eliane listou alguns livros para quem quer começar a se aventurar na literatura erótica. Todos eles estão disponíveis para empréstimo na Biblioteca Pública (Rua Cândido Lopes, 133 – Centro, Curitiba).
Eliane indica* |
Eros, tecelão de mitos – A poesia de Safo de Lesbos, de Joaquim Brasil Fontes (São Paulo: Iluminuras, 2003) |
Sonetos Luxuriosos, de Pietro Aretino (Sonetti Lussuriosi) – Edição brasileira da Companhia das Letras, com tradução de José Paulo Paes |
As Relações Perigosas, de Choderlos de Laclos (Les Liaisons Dangereuses) – Edição brasileira da Ediouro, com tradução de Carlos Drummond de Andrade |
Os 120 Dias de Sodoma, de Marquês de Sade (Les 120 Journées de Sodome) – Edição brasileira da Iluminuras, com tradução de Alain François |
O caderno rosa de Lori Lamby, de Hilda Hilst (São Paulo: Globo, 2005) |
Poesia Erótica em tradução, de José Paulo Paes (São Paulo: Companhia das Letras, 2006) |
Um mais além erótico: Sade, de Octavio Paz (tradução de Wladyr Dupont, São Paulo, Mandarim, 1999) |
O amor natural, de Carlos Drummond de andrade (Rio de Janeiro: Record, 1992) |
Contos Eróticos, de Dalton Trevisan (Rio de Janeiro: Record, 2002) |
*Todas as obras estão disponíveis para empréstimo na Biblioteca Pública do Paraná.
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