Jornada de alemães, estepes e sonhos

Rafael DabulO alemão é um povo viajante. Dos cavaleiros teutônicos a Von Martius, dos avós de muita gente (inclusive os meus) aos cientistas que trabalham em todo o mundo, eles estão lá – e, é certo, aqui e acolá. Todos têm coisas para contar; nem todos, porém, viveram às margens do rio Volga, região da Rússia para onde seguiram entre os anos de 1762 e 1782. Quem foram esses homens e mulheres que trocaram uma "terra civilizada" pelas sombras da estepe? Em seu primeiro romance, "Jornada", o escritor paranaense Sérgio Neville Holzmann busca uma resposta poética para essa questão.

Sérgio, ele próprio descendente de uma família de "alemães-russos" que trocou a Rússia pelo Brasil no século XIX, diz que sua pretensão não foi criar uma obra fidedigna em termos históricos, mas apenas e tão somente uma boa história de ficção. "O ponto de partida é sim, histórico, mas os personagens e os cenários nasceram e acabaram fugindo do meu controle", conta. Segundo ele, o escritor pode se dar ao luxo de certas liberalidades criativas, mesmo em romances históricos. "A uma certa altura do livro, por exemplo, eu citei uma receita de lebre com sálvia e alecrim. Um amigo que leu o livro perguntou: ‘mas lá existiam sálvia e alecrim?’. E eu respondi: ‘no meu romance tem’!", brinca. Autores mais ou menos sofisticados – como Alexandre Herculano, Humberto Eco e Dan Brown – reforçam a tese.

Apesar da liberdade de criação, o fato é que "Jornada" evoca o velho e bom país de Tolstói e de filmes como "Dr. Jivago" e "Os Girassóis da Rússia": o frio está lá, assim como a aridez do cenário, os sonhos quebrados e as esperanças que seguem no espírito.

Há, é certo, qualquer coisa de "genético", quem sabe uma memória atávica que, dois séculos depois do plano de colonização sonhado pela czarina Catarina II, resolveu brotar na mente de um executivo brasileiro. "Mais de uma pessoa fez essa afirmação. Eu acho que tem um pouco sim, isso apesar de eu ser absolutamente misturado em termos raciais. O nome Holzmann é apenas um patronímico, eu tenho antepassados portugueses, polacos e negros. Aparentemente, porém, foi esse gene que predominou em termos criativos", explica. "Não sei se eu conseguiria escrever um livro sobre os outros antepassados."

O tempo passou e, por conta das dificuldades, os alemães do Volga trocaram a Rússia pelo "Ocidente", por países como os Estados Unidos, o Canadá, a Argentina e o Brasil. Muito dos que ficaram por lá, inclusive, acabaram vítimas de atos genocidas como os espurgos stalinistas. Partindo-se desse fato, a pergunta lógica ao autor – não mais um "alemão do Volga", mas um "alemão de Ponta Grossa-Lapa-Palmeira-Guarapuava-Curitiba" – diz respeito a uma possível continuação de "Jornada", já em terras brasileiras. Segundo Sérgio Holzmann, é uma seqüência lógica, que pode aparecer em breve. "Minha idéia inicial era escrever uma história mais próxima, desses colonos em terras paranaenses. O caso é que a outra, mais antiga, veio à tona primeiro. Uma nova obra demandaria, porém, uma descaracterização maior em termos tanto de geografia quanto de família. Afinal, os fatos são recentes – e, além disso, eu escrevo ficção."

Serviço
"Jornada", de Sérgio Holzmann.
Projeto editorial de Antonia Schwinden, projeto gráfico de Juliana Scapucin.
Lançamento em Curitiba neste sábado, a partir das 11 horas, na Livraria Dario Vellozo (Rua São Francisco, 325, Setor Histórico).
Preço sugerido para venda: R$ 40,00.

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