O poeta e tradutor Ivan Junqueira morreu nessa quinta-feira, 03, no Rio, aos 79 anos, de insuficiência respiratória. Ele estava internado havia um mês no Hospital Pró-Cardíaco. O corpo foi enterrado à tarde no Mausoléu da Academia Brasileira de Letras, no cemitério São João Batista. Ele ocupava a cadeira 37 desde 2000 e era um dos membros mais ativos da casa. Dois livros inéditos serão lançados pela sua editora, a Rocco, até o fim do ano.
Fumante inveterado, Junqueira tinha enfisema pulmonar. Ainda assim, não largava o cigarro. “Ele era muito bem quisto na ABL. Eu contava sempre a ele que meu pai morreu muito mais novo, pois fumava desbragadamente. Mesmo com todos os avisos de que a saúde estava precária, o vício era mais forte”, lamentou o acadêmico Arnaldo Niskier, durante o velório, na sede da casa.
O presidente da academia, Geraldo Holanda Cavalcanti, determinou luto de três dias. Ele lamentou a perda de um membro que prezava especialmente pelas publicações. “Ele era exemplar, estava sempre à disposição, e tinha interesse especial por nossas publicações. Fazia tudo com muito esmero e dedicação. Para este ano, tinha como projeto lançar 14 livros, e boa parte já foi realizado.”
Segundo a viúva, Cecília Costa Junqueira, o poeta trabalhou até o fim. “Ele terminou o livro novo e continuou produzindo.” A chegada dos 80 anos, em novembro, o deixava “supersticioso”. “Ele dizia ‘vai acontecer alguma coisa comigo’, achava estranho que fossem lançados tantos livros de uma vez.”
Os lançamentos a reboque da data são a coletânea de ensaios Reflexos do Sol Posto, previsto para agosto, e Essa Música, de poesias inéditas, programado para outubro. De acordo com a Rocco, no primeiro, o autor analisa a atual produção poética brasileira, com remissões a João Cabral de Melo Neto (1920-1999) e Augusto dos Anjos (1884-1914). Seria “possivelmente” sua última coletânea de ensaios, conforme ele avisou na abertura do livro.
O segundo já é tratado como “obra-prima” por quem o leu. Para o crítico Alfredo Bosi, seu amigo, chamado a assinar a quarta capa, o livro “alcança o zênite de sua trajetória poética”. O poeta Marco Lucchesi, colega recente de ABL mas amigo desde os anos 1990, quando trabalharam juntos na revista Poesia Sempre, da Biblioteca Nacional, diz na orelha que “Essa música, essencialmente atonal, perfeitamente esquiva, contínua e sincopada, é uma pauta de raro encantamento”.
Nessa quarta, 03, no velório, Lucchesi reiterou: “Ele é uma das grandes vozes da poesia brasileira, talvez a última que podia dialogar com a literatura universal, ao mesmo tempo sendo profundamente enraizada na tradição literária brasileira. Ele vai levar o tempo necessário para ser reconhecido. A eternidade não tem pressa”.
Motivada também pelos 80 anos, a editora Nova Fronteira programa lançar uma edição de bolso da tradução de Junqueira para poemas de Elliot, que ele vinha revisando, disse a viúva.
Referência
Ivan Junqueira nasceu no Rio em 1934. Publicou 40 livros nas áreas de poesia, ensaio e tradução, e foi vertido para mais de 20 línguas. Era considerado referência na tradução no Brasil de T.S. Elliot (1888-1965) e do francês Charles Baudelaire (1821-1867).
Sua formação foi em medicina e em filosofia, cursos que não chegou a concluir. Em 1963, começou a trabalhar em jornais. O primeiro foi a Tribuna da Imprensa, no qual atuou como redator. Depois passaria pelo Correio da Manhã, o Jornal do Brasil e O Globo, chegando a subeditor.
Na condição de crítico literário e ensaísta, colaborou com revistas e jornais, como o Estado. Ele também dava conferências sobre literatura brasileira. Em sua passagem pela presidência da ABL, entre 2004 e 2005, destacou-se pela programação de palestras no auditório do prédio anexo ao Petit Trianon, rememorou Niskier.
Holanda Cavalcanti lembrou a “sina da poesia” que o acompanhou na casa de Machado de Assis: sua cadeira tem como patrono o poeta português Tomás Antônio Gonzaga (1744-1804) e foi ocupada antes de Junqueira por João Cabral. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.