Ambas têm projetos ligados à poesia. Regina Braga quer estrear na direção fazendo um filme sobre a correspondência da poeta Elizabeth Bishop. Bianca Comparato sonha há tempos com um filme sobre Ana Cristina César, considerada, talvez, o maior nome da geração mimeógrafo dos anos 1970 e que se suicidou em 1983. As duas compartilham algo mais, além da poesia – fazem diferentes momentos da vida de Irmã Dulce no longa de Vicente Amorim sobre a religiosa baiana que estreia nesta quinta-feira, 27, no Centro/Sul do País. Já em cartaz no Norte e Nordeste, Irmã Dulce vai ocupar um total de 100 salas. É pouco para seu tamanho – e até ambição -, mas o circuito está tomado por Jogos Vorazes: A Esperança – Parte 1.
Regina já interpretou personagens reais – Chiquinha Gonzaga, a própria Bishop. Mas nunca lhe ocorreu algo como em Irmã Dulce. “De repente, realidade e ficção se misturaram na minha cabeça. Numa cena, eu tinha de abraçar um dos pobres da irmã, e fazer o gesto da cruz sobre ele. Essa pessoa havia sido abençoada pela própria Irmã Dulce e, ao reproduzir o gesto, querendo ser verdadeira, tudo se misturou para mim. Nunca havia experimentado isso antes. Foi muito forte.”
É a primeira vez que Regina carrega um filme, e isso também é novidade. Bianca conta como foi forte seu envolvimento com o papel. “Foi muito importante que o (diretor) Vicente (Amorim) tenha nos escolhido com antecedência. Regina e eu viemos para Salvador, percorremos as obras assistenciais de Irmã Dulce, ensaiamos juntas, conversamos com muita gente que a conheceu. Foi tudo muito intenso. Já havia lido muito sobre ela, visto as imagens, e havia o próprio roteiro, mas o fato é que, nos preparando juntas, compartilhando experiências, Regina e eu criamos a mesma personagem, e era isso que Vicente e (a produtora) Iafa (Britz) queriam.”
Logo no começo da missão de Irmã Dulce, um médico diz que ‘essa moça’ não vai viver muito. Seus problemas respiratórios antecipam pouco tempo de vida. Mas, apesar da dificuldade para respirar que a deixava ofegante, e representava esforço adicional à sua luta diária pelos pobres, Irmã Dulce viveu bastante. Ela começa menina, vivendo a experiência da descoberta da pobreza com a mãe (Glória Pires, numa participação realmente especial), vira Bianca e, de repente, de maneira quase imperceptível, é como se Bianca saísse por uma porta e Regina entrasse pela outra. A continuidade não só é sutil, como perfeita. As duas atrizes foram tocadas pela personagem.
“Nesse momento do País, é muito importante voltar a Irmã Dulce”, observa Bianca. “O Brasil saiu dividido da eleição (para presidente). Vi coisas que me doeram muito. Acusações graves, uma verdadeira guerra verbal de pobres e ricos.
E a Irmã Dulce vivia isso. O compromisso dela era com os pobres, a quem se dedicou.” Regina acrescenta – “É um exemplo de dedicação como nunca vi. E não é uma caridade ofensiva nem culpada. Ela se dedica porque é o correto. Há uma questão ética em Irmã Dulce que permanece atual. Não foi por acaso que ela teve todos aqueles problemas e enfrentou resistência dentro da própria Igreja.”
Havia momentos em que as atrizes se angustiavam, “Ela não tinha curva (dramática). Pedia ao Vicente – será que ela não têm de duvidar mais, de vacilar mais? A decisão dele (e dos roteiristas L.G. Bayão e Anna Muylaert) de fazer a curva por meio de outros personagens, o filho, a madre superiora, parecia arriscada, mas deu muito certo”, avalia Regina, emocionada depois de assistir à pré-estreia do filme, em Salvador. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.