Foi a coletiva mais concorrida, a mais disputada do 66.º Festival de Cannes, até agora. Os irmãos Coen conseguiram, de novo. Ethan e Joel estão mostrando aqui seu novo filme, Inside Llewin Davis, sobre a cena musical de Nova York, em 1961, quando as folk songs haviam virado fórmula. Foi neste universo que surgiu um certo Bob Dylan, mas o filme não é sobre ele. Para captar o clima da época, os Coens criam um personagem fictício – Llewin Davis -, que é a soma de vários outros que surgiram na época.
Pode ser que o culto aos Coens seja exagerado, mas em Cannes eles são reis. O público ria alucinadamente na sessão de imprensa de Inside. Nem se dando conta de que a boçalização – a ridicularização – dos personagens virou um recurso fácil que Ethan e Joel repetem, de filme para filme. O efeito no público é imediato e a massa se sente superior aos personagens. Logo de cara há um incidente envolvendo um gato. Na verdade, trata-se – o que ocorre com o gato – de um típico clichê coeniano – e o publico ri, mais uma vez. O gato é essencial, a chave de Inside Llewin Davis? O próprio Joel admitiu na entrevista. Para evitar que o filme ficasse só na recriação da atmosfera, e para que ninguém pudesse dizer que não tem história, Ethan, como sempre o roteirista, criou o tal gato. E, posto que se trata de um road movie, não é mera coincidência que ele se chame… Ulisses.
Não é de hoje que o fantasma de Homero assombra os Coens – basta lembrar-se de E Aí, Irmão, Cade Você? John Ford era chamado de Homero de Hollywood e em seus filmes dos anos 1950 ele recorria a um grupo folclórico chamado The Sons of Pioneers, exatamente do tipo que os Coens, em nome da modernidade – da pós-modernidade deles – agora querem destruir. Como já debocharam do western tradicional na nova versão de Bravura Indômita, o clássico de Henry Hathaway, talvez exista aí uma vontade programática de atingir o grande Ford.
O francês Arnaud Desplechin, que também está na competição, é muito mais respeitoso com o mestre e, em Jimmy P – Psicanálise de Um Índio da Planície, que se passa no Oeste, após a 2.ª Guerra, cita um dos clássicos do diretor nos anos 1940, A Mocidade de Lincoln, com Henry Fonda como o mito fundador da ‘América’.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.