A inspiração do dramaturgo Juca de Oliveira é alimentada pela indignação. Bairros degradados pelo crescimento descontrolado inspiraram Meno Male; o desinteresse da filha em ouvir seu comentário sobre um namorado resultou em Qualquer Gato Vira-Lata Tem uma Vida Sexual mais Sadia Que a Nossa; a corrupção que há séculos marca a sociedade brasileira é o tema de Às Favas com os Escrúpulos. “Escrevo sobre coisas que me chateiam”, conta ele, que já prepara um novo texto cujo título, As Mãos Limpas, indica o caminho político da trama. Ao mesmo tempo, retoca uma peça antiga, As Atrizes, cuja nova versão estreia na sexta-feira, 5, no Teatro Opus.

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Aos 84 anos, Juca vive a urgência do momento – mais conhecido pelo público como um ator consagrado, com uma carreira que já soma 58 anos, ele assina textos que atraíram verdadeiras multidões ao teatro justamente pela indisfarçável sinceridade. “Sem procurar vanguardas, Juca exercita seu instrumento de autor nos diálogos fluentes, nas situações bem armadas, na franca comunicabilidade, na construção de personagens com profundidade e coerência psicológicas”, anotou a crítica Ilka Marinho Zanotto, em 1987, no jornal O Estado de S. Paulo.

De fato, desde sua estreia na escrita teatral, com Baixa Sociedade, de 1978, Juca vem mostrando que o uso de fatos reais é o segredo que o torna autor dos maiores sucessos contemporâneos do teatro nacional: Baixa Sociedade teve cerca de 400 mil espectadores; Motel Paradiso (1982), 700 mil; e Meno Male (1991) ficou quatro anos em cartaz e teve cerca de 2 milhões de espectadores. A política é seu principal combustível, mas As Atrizes desponta como uma exceção ao tratar de um tema delicado: a forma impiedosa com que a sociedade despreza as pessoas que envelhecem.

A peça acompanha Marilda Ziliat (Angela Dippe), grande atriz que, na meia-idade, sofre com a escassez de papéis para sua faixa etária. Por outro lado, Irma (Renata Ricci) é uma jovem ambiciosa em busca da fama e que mede sua importância pelo número de seguidores que atrai nas redes sociais. Para conseguir o que deseja, ela seduz Igor (Blota Filho), diretor de teatro casado com Marilda. Ao fazer isso, Irma desagrada Cláudio (Giovani Tozi), ator inseguro e de pouco talento, mas desesperadamente apaixonado por ela. Para temperar o caldo, surge a Repórter (Mariana Melgaço), cuja índole duvidosa se revela pela paixão em disseminar fofocas e fake news de celebridades.

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“Quando escrevi, em 1991, queria mostrar a situação delicada vivida por colegas do teatro. Mas principalmente queria mostrar como nós, artistas, temos uma função social para tornar o ser humano mais solidário”, conta Juca que, na época, já contava com um elenco respeitável: Tônia Carrero, Lucélia Santos, Mauro Mendonça, Osmar Prado e Márcia Cabrita. Passados quase 30 anos, a peça continua atual. “Agora, na releitura, feita a pedido do diretor Léo Stefanini, notei que continuam os problemas, ou seja, a insegurança pessoal, a vaidade, a difamação. Só precisei incluir o WhatsApp.”

Juca abre um largo sorriso, ciente de que continua antenado nos fatos do dia a dia. Para isso, adapta seu belo apartamento na região dos Jardins às necessidades dramatúrgicas, com pilhas de livros, programas de teatro e recortes de jornal espalhadas pela sala. Curiosamente, como estão bem localizadas, elas não passam um ar de bagunça – ao contrário, até colaboram, de uma certa forma, para a decoração. Em um canto da sala, o sagrado: estátuas das duas deusas do teatro, gregas Melpômene e Tália, suas protetoras. No outro, o profano: uma enorme estante, onde se destacam aguardentes de boa procedência, suas incentivadoras.

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Apesar de tratar de temas espinhosos, a dramaturgia de Juca de Oliveira é carregada de humor. Por que? É a cultura grega que norteia a construção de sua escrita. “Aristóteles ensina que a tragédia tem como personagem um homem que é o repositório de virtudes humanas – prefere morrer a viver sem honra”, observa. “Na comédia, Aristóteles mostra o oposto, ou seja, um homem cheio de defeitos e imperfeições. Assim, ao escrever sobre alguém com problemas, você fará uma comédia.”

É por isso, continua ele, que seus textos políticos despertam risos. “Quando cito o Lula, as pessoas acabam gargalhando, não tem jeito”, provoca ele que, para confirmar que sua arte é apartidária, já causou mal-estar em 2003 quando, em A Flor do Meu Bem Querer, criou um protagonista (um político candidato à presidência) que resolve assumir um filho ilegítimo, referência a um assunto quente na época, envolvendo Fernando Henrique Cardoso.

Juca se defende: “Tudo é tirado do noticiário de jornais e revistas, não inventei nada”. E, para estabelecer essa liga com a realidade, ele criou o que chama de “momento de realidade”, ou seja, cena em que algum personagem lê as manchetes dos jornais daquele dia. “Em Meno Male e Caixa 2, eram cinco minutos garantidos de risadas”, relembra ele, confiante no efeito terapêutico do teatro. “Em meio a esse momento tão chocante, com denúncias de corrupção de um lado e 13 milhões de desempregados do outro, o público precisa sair melhor, quem sabe menos pessimista.”

AS ATRIZES
Teatro Opus. Shopping Villa Lobos. Av. das Nações Unidas, 4777. 6ª e sáb., 21h. Dom., 20h (não haverá 7/7). R$ 20. Estreia 5/7. Até 11/8

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.