Imprensa ganha boas publicações de música

Depois de um tempo de dificuldades, a imprensa cultural ganhou, nos últimos anos, um bom número de publicações sobre música. Na verdade, sobre arte em geral e comportamento -certamente na esteira do sucesso editorial e de crítica da Bravo, que acabou saindo de uma trajetória independente para os braços de uma “major’, no caso a editora Abril. Em três anos, vieram para cá as internacionais Rolling Stone e Billboard, ambas bem feitas e com material nacional se somando às reportagens gringas.

É uma vitória, principalmente porque abre-se de novo um leque de opções para o público consumidor de música. E aí entra uma diferença: “consumidor de música’ é aquele que vai atrás das novidades (seja o gosto que tiver), tanto nas lojas quanto nas bancas de revista. É aquele que ouve apenas aquela rádio que toca seu estilo preferido. É diferente daquele que liga o rádio por ligar, e vai procurando uma canção conhecida. E que acaba sendo mais suscetível às tendências da “moda’ ou às imposições da mídia.

Por exemplo: formou-se uma geração de ouvintes de música sertaneja. Hoje temos até o tal “sertanejo universitário”, que este escriba sinceramente não sabe o que é. Mas essa meninada que hoje lota as casas noturnas ouve desde criança o estilo, por conta da inundação de duplas no início dos anos 90s. Esses Victor e Léo, Fernando e Sorocaba, João Bosco e Vinícius, Hugo Pena e Gabriel, Ronny e Rangel, Christian e Cristiano (opa!) e Don e Juan (que barbaridade!) são todos filhotes musicais de Chitãozinho e Xororó, Zezé di Camargo e Luciano e Leandro e Leonardo, que foram colocados goela abaixo do grande público pelas rádios e pelas televisões.

Foi assim também na onda do pagode, e agora na invasão das bandas emo. São todos muito parecidos, cantam muito parecidos, vestem-se muito parecidos, e são “vendidos’ da mesma forma. Quem acompanha o programa “Ídolos”, da TV Record, pôde perceber o número gigantesco de jovens que se baseavam nos trejeitos de Di Ferrero, vocalista do NX Zero, para tentar ser uma estrela. Obviamente, nenhum deles está na fase final do programa.

E essa imposição da mídia fica evidente na análise da lista das músicas mais ouvidas nas rádios brasileiras, pesquisa do instituto Crowley divulgada na Billboard. O chamado “Hot 100” é composto, neste mês, por 68 músicas brasileiras e 32 estrangeiras (destas, a imensa maioria é do R&B de Beyoncé, Pussycat Dolls, Mariah Carey e Black Eyed Peas). Nas “nossas’, estão basicamente duplas sertanejas – incluindo aí Leonardo, em carreira solo -, sambistas e pagodeiros e, em escala menor, a música pop de NX Zero, Wanessa (Camargo), Pitty, Túlio Dek e até Skank e Titãs. Do que se poderia chamar de música brasileira, apenas Seu Jorge. E olhe lá, porque ele também teve que mudar de estilo, e de forma, para chegar às paradas.

Apesar de já ter falado em imposição da mídia, a pergunta pode ser aquela, da marca de biscoitos: a mídia divulga porque o público quer ou o público quer porque a mídia divulga?

É difícil imaginar que quase toda a população brasileira tenha o mesmo gosto musical. Ou, reduzindo, que quase toda a população que ouça rádio tenha o mesmo gosto musical? É mais plausível imaginar que, para agradar o público médio, as emissoras de rádio e TV acabem apostando em um gênero musical (ou dois) para ganhar audiência. Em Curitiba, por exemplo, as rádios FM mais ouvidas têm perfil musical semelhante -tocam as músicas que estão nas paradas, e não fogem delas.

Aí, graças à Billboard de novo, podemos fazer uma comparação com a lista das cem músicas do momento nos Estados Unidos. Se Britney Spe,ars, Rihanna, Miley Cirus e Kanye West estão lá, nos primeiros lugares (se aqui estão, imagine lá…), é possível identificar outros estilos, como o country de Toby Keith, Keith Urban, Chris Young e Reba McEntire, e até mesmo o standard de Michael Bublé.

Bublé, que por sinal tem o álbum mais vendido, segundo a revista americana. Essa lista, a dos discos mais vendidos, é ainda mais surpreendente, se compararmos com o Brasil. Nela estão Kiss (posição 2), Barbra Streisand (4), Pearl Jam (16), Harry Connick, Jr. (18), Beatles (34), Mark Knopfler (87) e até mesmo Ella Fitzgerald (178) e Frank Sinatra (191).

Claro que a lista de discos mais vendidos não precisa bater com a das músicas mais executadas – diz-se, sem certeza, que o álbum mais vendido no País é Elas Cantam Roberto Carlos. Mesmo assim, o contraste entre as listas brasileira e norte-americana é evidente. Seria como se tivéssemos, pelo menos entre as cem músicas mais ouvidas, alguma coisa de Chico Buarque (que, ora veja, já teve canção como a mais tocada no Brasil), Maria Rita ou Gilberto Gil.

E aí está outro problema da mídia. Aqui, quando algo faz sucesso, vira “bala Zequinha” e não para de tocar em todos os lugares. Não há espaço para outras vertentes, para coisas novas ou antigas. Azar de quem gosta realmente de música.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna