Igor Cotrim estrela comédia ‘Elvis & Madona’

Parece trama de Pedro Almodóvar – transformista que se metamorfoseia em Madona (com um N só) se envolve com lésbica que se veste como homem e adota a persona de Elvis Presley. A relação não é só de amizade nem platônica – produz uma família. Desde “Tudo Sobre Minha Mãe”, Almodóvar vem se questionando sobre as novas possibilidades de família no século 21.

“Elvis & Madona” poderia muito bem ter conexões com o universo almodovariano, mas é um filme brasileiro de Marcelo Laffitte. Igor Cotrim e Simone Spoladore são os intérpretes dos papéis, o filme possui uma graça toda especial, mas está longe de ser uma unanimidade – o que, em termos, é bom, pois Nelson Rodrigues já dizia que toda unanimidade é burra.

Desde o Festival do Rio de 2009 e, depois, em Tiradentes e Gramado, boa parte da polêmica que “Elvis & Madona” provoca passa por uma questão apenas – o filme seria, ou é, machista. Gay faz filho em lésbica e ainda enfrenta o gigolô que o explorava. Gente tão atravessada, em termos de comportamentos padrão (ou convencionais), coloca em pauta temas como fidelidade. ‘Elvis’ não perdoa ‘Madonna’ por ter participado de um filme pornô para levantar fundos para o casal.

“Elvis & Madona” começou a surgir há 12, agora 13 anos, quando Marcelo Laffitte foi mostrar um curta no Festival de Miami. Ele ligou a TV e assistiu a um programa de recorte sensacionalista. Tudo era muito bizarro, mas um personagem, ou uma situação, caiu como um raio sobre Laffitte. Em meio à lavagem de roupa suja, surgiu a história do pai que abandonou a família para se tornar travesti. Anos mais tarde, ele tentou se reconciliar com os parentes, mas se apaixonou pela namorada do filho. Na hora, Laffitte foi fisgado.

“É uma história de amor que eu queria contar com delicadeza, e muito humor.” Face ao sucesso de público que “Elvis & Madona” obteve em diferentes festivais – em Tiradentes, plateias de velhinhas foram cumprimentar o diretor emocionadas -, não deixa de ser curioso assinalar que ninguém colocava fé na história, só Laffitte e seus atores. “Foi duro conseguir dinheiro para as filmagens. Começamos a filmar em 2007, a verba acabou, paramos e recomeçamos em 2008.”

O risco, para o diretor, sempre foi chocar o público mais conservador, e isso era uma coisa que ele não queria. Essa história poderia ser contada de várias maneiras – mais escrachada, mais provocativa. Laffitte preferiu o ‘menos’. “Mostrei Elvis & Madona para os públicos mais diversificados. Os dez minutos iniciais são sempre decisivos. Os personagens são tão bem desenhados e apresentados que as pessoas se desligam do fato de que se trata de um travesti e uma lésbica se apaixonando. O público se liga na história, nessa coisa do masculino e do feminino do casal que sobressai conforme as situações.”

Um ponto em favor do filme é o fato de que, embora eventualmente fazendo uso de ambientes e situações, digamos, degradantes, “Elvis & Madona” não recorre a estereótipos de marginalidade para compor sua dupla. Madona é cabeleireira e quer montar um show de drag queens. Elvis entrega pizzas, mas é fotógrafa. Nenhum dos dois é ‘marginal’ e ambos os atores se empenham em criar personagens com consistência e densidade. Simone Spoladore dispensa apresentações. É uma das melhores (a melhor?) atrizes de sua geração. Igor Cotrim, ator de teatro, participou, como machão, do reality show “A Fazenda”, na Record. Ele incorporou o hit “Who’s That Girl?”, de Madonna (a com dois Ns). Vira o bordão da personagem. Sempre que se olha no espelho e se vê montada, Madona faz a pergunta – quem é essa garota?

Machista? Marcelo Laffitte não encanou com a questão de ser politicamente correto, ou não. O que ele queria era contar essa história. Foi um longo processo e, mesmo pronto, “Elvis & Madona” demorou para entrar em cartaz. Um blockbuster? Muito mais um pequeno filme ‘autoral’, e não vai nisso nenhum desdouro, nenhuma crítica. Simone e Cotrim, eles sim, são grandes. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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