O ator Hugo Bonemer preparava-se para gravar mais uma cena da série Natália, do Universal Channel, quando prestou atenção no colega de elenco, Cláudio Lins. “Ele estava de olhos fechados, batucando na perna, completamente alheio ao que passava ao redor. Quando perguntei o que estava fazendo, Cláudio disse que estava compondo canções para um musical. ‘E é a sua cara, você devia participar da audição’, ele completou, me deixando atordoado.” De fato, Lins dava mais um arremate em uma das letras que vão compor Ayrton Senna, o Musical, que estreia no dia 10 de novembro, no Teatro Riachuelo, no Rio de Janeiro. E com Bonemer no papel principal.
Experiente no gênero – brilhou tanto em clássicos da estirpe de Hair como em Yank!, belo exemplo off Broadway -, o ator sentiu um frio percorrer a espinha ao se deparar com a dimensão do desafio. Afinal, o piloto Ayrton Senna persiste como exemplo de talento e persistência brasileira, mesmo depois de passados 23 anos de sua morte. Suas conquistas transformaram sua fama de herói em algo inquebrantável. “E, ao contrário de outras figuras que inspiraram musicais, ele não cantava”, completa Bonemer.
“Esses também foram nossos desafios quando iniciamos o projeto”, conta Aniela Jordan, da Aventura Entretenimento, produtora responsável pelo espetáculo. “Desde o início, não era para ser uma biografia, pois o Senna é uma figura grande demais para isso. Foi isso que pedi aos diversos roteiristas consultados.”
A maioria, porém, não escapava da linha biográfica. “Quando já pensava em desistir do projeto, Cláudio Lins se ofereceu para trabalhar uma ideia. Aceitamos e, dias depois, ele voltou com um roteiro e canções criadas ao lado de Cristiano Gualda – era justamente aquilo que buscávamos.”
A trama parte de alguns dados reais, mas trabalhados de uma forma onírica a fim de sugerir ao espectador uma ideia da grandeza da vida e da carreira de Ayrton Senna. A história, de fato, é eletrizante e se concentra nas quatro últimas voltas do GP de San Marino, no circuito de Ímola, naquele fatídico dia 1º de maio de 1994, quando Senna sofreu o acidente fatal, na sétima volta.
Enquanto se preocupa com a prova – o alemão Michael Schumacher ameaça ultrapassá-lo -, Senna é assediado por flashes de pensamentos, que envolvem desde momentos pessoais como profissionais. “As mulheres de sua vida, por exemplo, não serão identificadas – apenas vamos mencionar seus amores”, comenta Aniela, que convidou Renato Rocha para dirigir o espetáculo. Além de teatro, ele também tem experiência com circo, o que é decisivo no musical. “Ao longo da apresentação, teremos artistas no trapézio, dando saltos mortais. É justamente essa sensação de perigo que vai traduzir o risco pelo qual Senna e todos os pilotos passavam nos domingos de prova.”
“Não será a reprodução de um Grande Prêmio”, alerta Bonemer, que venceu 300 candidatos para conquistar o papel. “Renato criou cenas que estimulam a saudade do Ayrton, além de valorizar sua garra, coragem, e também sua fé. Queremos estimular o público com sensações.”
Claro que não faltarão momentos e personagens decisivos – Alain Prost, por exemplo, foi o antagonista ideal na construção da mítica figura de Ayrton Senna. Ao se apresentar como seu principal rival, o piloto francês incitava o brasileiro a buscar a superação, o que resultou em disputas memoráveis, inflamando uma torcida que persiste ativa até hoje.
Além das cenas envolvendo artistas de circo (que vão compor cerca de metade do elenco), a adrenalina de uma corrida de F-1 será estimulada, de forma inteligente, pelas músicas. “São canções dificílimas de se apresentar”, observa Bonemer. “A exigência vocal vai do mais baixo ao mais alto em poucas notas, acompanhando o ritmo da melodia, que simula a troca de marchas e a conquista de velocidade.”
Nascido em junho de 1987, Hugo Bonemer estava para completar 7 anos quando Senna morreu na pista. “Mesmo pequeno, acordava cedo aos domingos para acompanhar a torcida do meu pai e do meu irmão diante da TV”, lembra. “Naquele dia, quando acordei, eles já estavam chorando e meu pai ficou bravo comigo porque não estava triste. Meu choro foi motivado pela tristeza deles.”
Ainda que não seja um musical biográfico, o ator busca detalhes sobre o piloto, assistindo a vídeos, lendo livros e, principalmente, consultando documentos arquivados no Instituto Ayrton Senna. “O acervo é completo”, comenta Bonemer que, mesmo que os nomes delas não sejam citados, pretende conversar com Xuxa e Adriane Galisteu, com quem Senna se relacionou. “Elas poderão me revelar curiosidades úteis, como com qual mão ele passava requeijão no pão.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.