Horizonte fotográfico

pensamentof060706.jpgO que existe além do horizonte? Motivada pela necessidade de sua sobrevivência, a humanidade sempre soube que atrás de todo o horizonte existe um mistério.

Para a cientista norte-americana Deena Skolnick, o pensamento fantástico (metaphysical reasoning) pode ser uma ferramenta cognitiva inata no ser humano. Paul Bloom, professor de Psicologia da Universidade de Yale, é mais incisivo: considera que certos fatos relacionados a como a ficção (pensamento fantástico) funciona não são aprendidos ? são produtos naturais da arquitetura de nossa imaginação.

A imaginação, então, é uma função cognitiva de importância vital, uma vez que em grande medida é através dela que se faz avançar o conhecimento humano. De fato, a modalidade intelectual do conhecer humano está em conexão dinâmica e constante com as demais modalidades de conhecer de nossa mente.

Neste ensaio veremos como o horizonte da Fotografia do século XXI se expande rapidamente, graças à criatividade e sensibilidade tanto de grandes artistas quanto de milhões de fotógrafos e apreciadores anônimos da Fotografia.

Pensamento fantástico

A atenção visual do fotógrafo pode ser captada por vários fatores. Mas a emoção e a beleza desempenham um papel de grande relevância no ato de fotografar.

Não estamos aqui subestimando de forma alguma a intenção expressiva do fotógrafo (com seus múltiplos níveis e modalidades) presente no pressionar do botão de disparo da câmera; na verdade, estamos considerando esta intenção segundo um grau psicológico mais profundo.

Porém, o que é natural, emoção e beleza são de difícil tradução em palavras. E mesmo de difícil percepção pelo próprio fotógrafo. Neste sentido, podemos dizer que o fotógrafo vê, mas está cego. Ou que ele conhece, ao mesmo tempo que desconhece o que fotografa.

A Fotografia do século XXI ? a Era do Conhecimento ? é altamente pessoal e criativa. Impregnada de emoção e reflexos de beleza. Isto quer dizer que a imaginação, impulsionada pelo nosso desconhecimento racional das emoções e belezas que nos inspiram, entra em cena. E com ela o ?pensamento fantástico?.

A emoção

Roland Barthes diz que ?(…) é ele [o punctum] que parte da cena [das fotos], como uma flecha, e vem me transpassar?. ?(…) essa ferida, essa picada, (…) esses pontos sensíveis?.

É a própria linguagem de Barthes em A Câmara Clara que, descrevendo aquilo que é intenso nas imagens fotográficas, apresenta-nos o pensamento fantástico em ação ao decifrar os conteúdos afetivos e estéticos de uma imagem.

A linguagem fantástica, como ?a flecha que transpassa?, ou ?ferida, picada?, usada para descrever, em última análise, aquilo que em linguagem intelectual poderia ser chamado de ?objeto visual fotográfico?, é, convenhamos, bastante eloqüente no que se refere a emoções e reflexos de beleza.

A linguagem fantástica, a descrição de ordem mágica seria, então, uma abordagem eminente na decifração afetiva de imagens fotográficas. E isto porque estaríamos, como vimos, trazendo à luz conteúdos que o fotógrafo registrou e que estão, em grande medida, em estado virtual na imagem. Em outras palavras, estão esperando para serem conhecidos.

Qualquer pessoa fotografando também pode tornar mais interessantes as suas imagens se aborda o que fotografa (uma bela paisagem, o retrato de quem se ama etc.) sob um ponto de vista fantástico. Por exemplo, a bela paisagem pode ser ?um pedaço do paraíso?, e a pessoa que se ama ?alguém vindo do céu?. Estes pensamentos fantásticos inspiram o fotógrafo a realçar aspectos visuais que até então poderiam ter ficado fora da composição.

A beleza

O papel da beleza na imagem fotográfica ? bem como na vida ? é tão importante quanto controverso. Importante, pois revela a essência suprema da imagem fotográfica (por mais ilógica que possa parecer a expressão ?essência suprema?). E controverso, pois revela a visão de mundo de filósofos, artistas, intelectuais, enfim, das pessoas que exercem uma influência sobre a vida maior do que comumente supõe-se.

Aqui é suficiente dizer que a beleza fotográfica, normalmente presente em fragmentos sob o ponto de vista do self, é, como toda a existência da beleza, uma fonte inesgotável de idéias novas para quem a contempla. E que sob a luz do pensamento fantástico, a beleza é muito mais que um simples adereço.

Momento Decisivo

Um legado inestimável da Fotografia do século XX é o conceito de momento decisivo, cunhado por editores do brilhante fotógrafo francês Henri Cartier-Bresson e que define o fator essencial de sua obra.

Cartier-Bresson, de gênio artístico inigualável, poderia definir momento decisivo como ?o momento em que as forças do universo convergem para transformar beleza em imagem fotográfica?. Acredito que este ?pensamento fantástico? exprime efetivamente, ainda que parcialmente, uma dimensão da fotografia de Cartier-Bresson.

Além do horizonte

Quando pergunto a uma criança ?o que existe além do horizonte??, ela geralmente responde: o céu. Acima de tudo, esta resposta (bem como outras possíveis) revela uma sabedoria fértil e viva, envolta em mistério.

Na verdade, a imaginação sempre desempenhou um papel importante no avanço das civilizações. Mas o fato é que talvez nunca na história da humanidade o pensamento fantástico foi tão necessário, e para tantas pessoas, uma vez que através dele podemos desvendar um mistério ainda maior: o do sentido pessoal da vida. Assunto que a Fotografia tem muito a dizer.

Roberto Lopes (robertolopes@pron.com.br) é fotógrafo, pesquisador da imagem e editor do site de tecnologia fotográfica mais acessado do Paraná ? Pensamento Fotográfico. Atualmente trabalha em um livro sobre a dimensão intelectual da Fotografia.

Acesse www.parana-online.com.br/fotografia/

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