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Hércules Gomes desvenda a tradição com Chiquinha

Antes de recriar, é preciso conhecer a criação. A frase que quase soa como um alerta é de Hércules Gomes, um raro pianista de música brasileira mais alinhado com o pensamento tradicionalista, apesar de suas interpretações sem amarras revelarem influências que vão de Egberto Gismonti a Cesar Camargo Mariano. “Estão tudo lá quando eu toco”, diz.

O estupendo disco que lança nesta quarta, 23, no Sesc Pinheiros, No Tempo da Chiquinha, é uma coleção de 13 faixas, muitas delas raras e com momentos inéditos, que Hércules mostra no momento em que Chiquinha Gonzaga, a mulher que criou as bases do choro, teria 170 anos (completados em 17 de outubro de 2017). Hércules falou com o jornal “O Estado de S. Paulo” por telefone, há uma semana, direto da Flórida, nos Estados Unidos, onde estava a convite da universidade local para uma palestra sobre música brasileira. “Infelizmente, essa primeira manifestação de música urbana ainda é pouco conhecida fora do País. As pessoas ficam muito curiosas quando ouvem.”

A dificuldade das transgressões artísticas, diz, está no conhecimento das origens. “Antes de querer modificar algo, é preciso conhecer e tocar o estilo para não correr o risco de fazê-lo virar uma outra coisa, virar jazz.” Ele fala sobre a mudança de orientação que sente de seu instrumento depois do final dos anos 50. “Da década de 60 para cá, depois do surgimento da bossa nova, passaram a existir as duas escolas (tradicionais e modernos). E, no geral, os tradicionalistas não gostam do que é feito sem conteúdo. E o choro é quase uma religião, tem seu ritual, não dá para criticar um chorão tradicional.” Ao mesmo tempo, ele diz que ninguém pode ser criticado por ser virtuoso. “O virtuosismo sempre esteve no choro, com Joaquim Callado, Pixinguinha, Patápio Silva e Radamés Gnatalli.”

O álbum com as peças de Chiquinha deve ser o primeiro de uma série na qual Hércules vai homenagear os “pianeiros” brasileiros, forma como eram chamados até o surgimento da bossa. Ernesto Nazaré, Tia Amélia, Laércio de Freitas (o último da espécie), Zequinha de Abreu e Bené Nunes seriam outros nomes.

Hércules conseguiu gravar seu álbum graças a um financiamento coletivo. “É mais do que um like do Facebook. As pessoas compram seu disco antes de ficar pronto.” Ele evitou as músicas mais conhecidas de Chiquinha e se aventurou por detalhes que poucos conheciam. Dentre eles, há o primeiro registro em álbum da voz de Chiquinha, retirada de uma gravação em uma espécie única de um LP encontrada no lixo por um pesquisador e conservada posteriormente pelo Instituto Moreira Salles. Dentre as pouco conhecidas, estão temas como Cintilante e Valquíria, que tinha suas notas grafadas em um broche de ouro que a compositora usava à época.

NO TEMPO DA CHIQUINHA

Hércules Gomes

Independente. Preço médio: R$ 26

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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