O diretor artístico do Teatro Municipal do Rio, André Heller-Lopes, colocou na sexta-feira, 29, seu cargo à disposição e se declarou solidário a Ana Botafogo e aos funcionários do teatro que estão sem receber há pelo menos dois meses. “Se os artistas não têm condições de trabalho, tenho que estar ao lado deles. Eles são a alma do teatro”, afirmou Heller. “As demandas da Ana são também as minhas demandas: se não existe salário nem orçamento, como diretor artístico, não posso programar nada.” O novo presidente do Municipal, Fernando Bicudo, afirmou que Heller, na verdade, foi exonerado.

continua após a publicidade

Juntamente com Cecília Kerche, Ana Botafogo é diretora do Corpo de Baile do Municipal (cargo que manterá na gestão de Bicudo). Na semana passada, depois de ter sido convidada a assumir a presidência do teatro, ela apresentou uma lista de condições para aceitar o cargo, entre elas a regularização dos salários e dos 13.º salários pendentes de servidores, aposentados e pensionistas. O secretário de Cultura, Leandro Sampaio Monteiro, informou que não podia esperar pela quitação das pendências para que Ana começasse a trabalhar (uma das exigências dela) e a bailarina, então, declinou do convite. Bicudo foi chamado em seguida e aceitou.

continua após a publicidade

“A Ana foi muito corajosa e colocou essa exigência que, na verdade, é uma demanda lógica: ela precisava de uma expectativa de orçamento e também que os salários estivessem em dia por uma questão de justiça com os ativos e inativos”, resumiu Heller. “Trabalhando em equipe, acho que fizemos milagre até outubro, fazendo adaptações na programação para manter o mesmo nível; mas chegamos no limite. Não posso pedir a um bailarino que precisa estar em forma, bem alimentado, para vir trabalhar se ele não tem sequer dinheiro para a passagem.”

continua após a publicidade

Heller frisou que colocar o cargo de direção artística do teatro à disposição é uma praxe quando um novo presidente assume para que ele possa formar uma equipe de sua confiança. No entanto, disse: “Não trabalhamos da mesma maneira; eu não poderia ficar e aceitar essas condições, não tem sentido”.

Ana Botafogo, por sua vez, diz ter sido surpreendida com a exigência de uma resposta imediata. A promessa era de que os atrasados seriam quitados até o dia 21 de fevereiro e ela afirmou que aguardaria então o pagamento para começar a trabalhar. A secretaria, no entanto, afirmou que não poderia esperar tanto tempo.

“Em respeito aos meus colegas, disse que ficaria se as condições fossem atendidas”, afirmou Ana. “Só fico chateada por não ter conseguido a reivindicação. Eu vivi o dia a dia do nosso desespero: são quase 500 funcionários e 300 aposentados e é muito triste ver as pessoas sem nenhuma condição.” A bailarina, no entanto, elogiou Bicudo, disse que ele é um grande admirador do teatro e que viria para somar esforços.

“Eu fui convidado para assumir a presidência do teatro por indicação dela, inclusive”, afirmou Bicudo. O produtor cultural informou que não terá um novo diretor artístico na vaga de André Heller. Ele chegou a convidar para o cargo o maestro Silvio Viegas, da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, mas ele não pode aceitar por conta de sua agenda.

“Então, teremos uma direção de dança (que continua a cargo de Ana Botafogo e Cecília Kersh), uma direção de orquestra, que fica com Tobias Volkmann, o regente titular da orquestra atualmente, e estou esperando a resposta de uma pessoa que convidei para assumir a direção de ópera; só posso dizer que é um brasileiro que está fazendo uma belíssima carreira no exterior”, contou Bicudo. “Vamos fazer um colegiado artístico, uma presidência democrática compartilhada com a elite das artes brasileiras, em que eu ficarei livre para sair em campo, arranjar patrocínio, fechar convênios, lutar por melhores condições para os artistas.”

Fernando Bicudo garantiu que os salários estarão regularizados até o dia 21 de fevereiro.

“E não se trata apenas de atualizar os salários”, frisou. “Precisamos dar carinho à alma dessas pessoas, valorizar sua autoestima, que foi muito massacrada nessa crise.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.