“Deixei a clínica no dia 17 de julho e, no mesmo dia, mudamos para cá.” Gustavo de Almeida Ribeiro, mais conhecido pelo apelido de Black Alien, não esconde a atual leveza de ser. Limpo, reabilitado, sem o álcool que o atormentava há tempos. Agora, isso é passado. Um fantasma que o assombra aqui e ali, mas distante, em pesadelos e momentos de ansiedade ou decepção. Ao sentar em uma cadeira de pano na varanda da casa onde mora há pouco mais de um ano, rodeado de árvores enormes, o rapper de 43 anos não esconde a ansiedade para o retorno definitivo à música após 11 anos desde o lançamento do primeiro e histórico disco, Babylon by Gus – vol. I: O Ano do Macaco, de 2004.
Seis dias separavam o início daquela tarde ensolarada de sexta-feira, 28, para a data de lançamento do segundo álbum solo de Gustavo (ou Gus, como os amigos o chamam), Babylon by Gus – vol. II: No Princípio Era o Verbo. O trabalho independente, disponível de forma gratuita a partir da quinta-feira, 3, tem a missão de suceder um disco que marcou a nova fase do hip-hop nacional, no início da década passada. O intervalo de 11 anos entre os álbuns só aumentou a expectativa dos fãs e de qualquer um ligado ao rap brasileiro. Enfrentar a pressão, contou Black Alien, foi duro.
“Lançar um disco depois de 11 anos…”, diz ele, enquanto, pensativo, busca entender o que sente com relação a colocar fim ao jejum de discos de estúdio e, ao mesmo tempo, suceder um disco tão elogiado (embora não tão bem comercialmente). “Fiquei preocupado no início. A expectativa do público era demais. Pensava: ‘Será que as pessoas vão gostar?’. Eles, os fãs, consideram meu disco um clássico. Fazer um álbum depois de um clássico é sempre uma responsabilidade muito grande. Isso é verdade.”
“Mas se posso dizer que aprendi é que eu não sou obrigado a fazer um outro clássico”, continua, enquanto alisa o cavanhaque longo. “O que aceitei é que posso e vou fazer o máximo possível. Colocar meu coração naquilo, neste disco. Espero que as pessoas gostem. Não posso criar expectativas porque, se não der certo, me decepciono. E isso é muito ruim para mim. Desencanei. Espero que as pessoas gostem. Eu gostei.”
Ele nunca ficou longe da música, nos palcos e nas participações especiais. Criou, por exemplo, a faixa Coração do Meu Mundo, canção feita exclusivamente para a novela da TV Globo Bang Bang, de 2005. Há pelo menos um par de anos, contudo, se ouve falar do segundo volume do trabalho solo de Black Alien.
Em outubro de 2013, Gustavo criou o projeto de crowdfunding para concretizar o lançamento do álbum. Assim que encerrou a arrecadação, em dezembro de 2014, internou-se mais uma vez. Queria deixar para trás a vida com os excessos que só lhe faziam mal e impediam de, afinal, criar o sucessor do seu primeiro disco. Na clínica, criou duas das 12 músicas que compõem o novo trabalho. Nasceram ali Somos o Mundo e Terra. Esta última foi transformada no primeiro single e, nele, Alien reforça seu estado de espírito no refrão. Repete “eu vou ficar bem” por três vezes.
Na mesma canção, também diz “procuro a nossa semelhança e não a nossa diferença”. “É uma mudança de mentalidade que decidi adotar”, explica o rapper sobre o verso. “Comecei a entender o que o outro tem que seja igual a mim. Preciso entender o outro. Isso me ajudou muito, cresci quando comecei a adotar essa postura.”
Hoje, Black Alien é sorriso e abraços. Seu disco flui energia positiva. Canções solares, que nada se inspiram em tempos difíceis entre reabilitações e recaídas. Ele quer olhar para frente agora. Pensa num possível disco de rock e celebra a vida distante da cidade grande. “Morava na Vila Madalena (em São Paulo). Bem no meio daquela loucura toda. Para quem estava em recuperação, não era bom. Dou fruta para os micos, vejo os bichos andando para lá e para cá. Antes, eu sentia falta até da sirene de ambulância. Era muito urbano. Agora, não. Eu vivo aqui para ouvir os pássaros cantando.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.