Se houve um bunker de resistência do rock nos anos 1990, esse lugar se chamava Sub Pop, em Seattle. Fundado em 1988 por Bruce Pavitt e Jonathan Poneman, projetou a era grunge para o futuro, com modéstia e caráter visionário – um ano após sua fundação, gravou o primeiro disco do Nirvana, Bleach, com o fantástico investimento de US$ 606,17.
As bandas que saíam dali conquistaram o mundo: Soundgarden, Pearl Jam, Nirvana, Mudhoney. O último foi o responsável por criar o rótulo “grunge”, uma espécie de ideologia da crueza que seguem até hoje. E eis que quase todos eles desembarcam nesta quarta-feira, 14, em São Paulo para contar aquela história em detalhes, no primeiro Sub Pop Festival (que agita na quinta-feira, 15, o Festival Bananada, em Goiânia). No Cine Olido, os músicos Mark Arm e Steve Turner (do Mudhoney) e Chris Slorach (do Metz), mais o executivo Chris Jacobs, gerente-geral da gravadora Sub Pop, conversam com o público às 20h45. Haverá também, às 19h, a exibição do Documentário I’m Now: The Story of Mudhoney (de Ryan Short & Adam Pease).
Quinta é hora dos shows. No Audio Club (Av. Francisco Matarazzo, 694 – Barra Funda), às 22h, toca o grupo punk Obits. Depois, às 23h, show do METZ, Em seguida, à meia-noite, o Mudhoney.
O grupo de Seattle chega modesto como sempre, mas a bordo de um álbum gigante: Vanishing Point, do ano passado. Steve Turner, membro fundador do Mudhoney (que fará um DJ Set às 21h, na abertura dos shows), não discorda de que esse novo disco seja bom, e que seja o mais claramente influenciado por Iggy Pop e Stooges. “Sempre tem muito dele em nossos discos, em todos eles, e nesse caso eu posso falar por Mark também. Mas também há muitas outras coisas. Iggy Pop é o mais óbvio, mas também tem muito de MC5, Motorhead, Skin Yard, The Fluid. Certamente Iggy é sempre um ponto de partida muito natural”, afirmou o guitarrista, em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo por telefone.
O Mudhoney está há 26 anos na estrada agora. Pode-se dizer que é hoje uma banda melhor do que já foi? “Estamos não só melhores, mas também mais velhos (risos). Acho que, quanto mais o tempo passa, mas diferentes do início a gente é, e não se trata de melhor ou pior. Certamente, somos diferentes”, avaliou Turner.
Entre as boas canções do novo álbum, há uma, Chardonnay, que revela um refinado senso de humor – além de se constituir também numa declaração de ódio ao vinho verde. “Get the fuck out of my backstage/I hate you, Chardonnay”, diz a letra.
“Gosto de vinho, mas não entendo nada. Mark é o verdadeiro connaisseur. Mas o fato é que nenhum de nós gosta de Chardonnay. E, muito mais do que gostaríamos, essa é a bebida que mais frequenta nossos camarins. Sempre que a gente chega em algum lugar, o camarim está com aquelas garrafas. A canção tira um sarro nisso.”
O documentário que será exibido na jornada, I’m Now, de Ryan Short e Adam Pease, retrata com humor e paixão a história do grupo. “Acho que o filme nos retratou muito bem. Poderia ter ido por ali, poderia ter feito assado – o pessoal sempre acha isso de uma obra desse tipo. Mas há diferentes maneiras de se contar a história de uma banda de rock, e os diretores escolheram a deles. Para ser honesto, eu acho esquisito um filme desse tipo sobre a gente, porque é como se tivesse contado toda nossa história e já não houvesse mais nada para viver. Mas eu adoro o filme.”
No ano passado, em entrevista, Arm contou sobre a origem do termo grunge. “A expressão surgiu devido ao som das guitarras, que era meio sujo. Meu jeito de cantar também não era propriamente bonito”, contou. “Não me importo realmente com esse rótulo. Nós na verdade só tocávamos punk rock.”
No colégio, Mark Arm criou a banda Mr. Epp and the Calculations, nome de um professor de matemática que tinham. “Em algum ponto, tornou-se uma banda de verdade e nós compramos instrumentos, e tivemos alguma repercussão e começamos a nos achar Jimi Hendrix. Você sabe: era como nos discos ao vivo de Jimi Hendrix, só que apenas a parte dos intervalos entre as músicas”, brincou.
A seguir, com o amigo de escola Turner, criou a banda Green River (que trazia em sua formação Stone Gossard e Jeff Ament, mais tarde famosos com o Pearl Jam). Logo após ver um filme num cinema de Seattle, um clássico de Russ Meyer de 1965 chamado Mudhoney, Turner e Arm adotaram o nome. Em 1988, seu hit Touch me, I’m Sick acabou virando o hino daquela cena emergente do grunge (Smells Like Teen Spirit, do Nirvana, só surgiria em 1991).
Mas e quanto à gravadora Sub Pop? Ela, que os lançou e foi importante para lançar todas as bandas grunge, ainda tem espaço nesse novo mundo da internet? É possível ainda fazer tantos discos relevantes e viabilizar tantas bandas? “Eu não sei. Acho que selos como o Subpop fizeram um trabalho admirável. Tornaram visíveis para os fãs e admiradores de música bandas que de outro modo não teriam chegado a tanta gente. Também produziram discos importantes, que mudaram a história da música.
Tiveram atitude e não tiveram receio. Óbvio que eles gostavam da música que vendiam, porque eram parte dela. Acho que agora há um novo sistema de divulgação, um novo tipo de interesse, mas as pessoas ainda amam a Subpop. Acho perfeitamente possível que os selos que promovem as bandas realmente independentes continuem dando frutos. Por exemplo: há selos independentes em Chicago produzindo bandas punks muito boas nesse momento. É um indicativo de qualidade”, disse Turner. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.