De uma visita ao zoológico de Berlim surgiu a ideia de produção do novo livro do escritor paranaense Guido Viaro, que trata das prisões a que o ser humano se submete nos diversos meios sociais. Influenciado por Clarice Lispector, Jorge Luis Borges, Thomas Mann e Helena Blavatski, Viaro está na sua sexta publicação. Em entrevista a O Estado, Viaro fala sobre seu livro, No zoológico de Berlim, as dificuldades de publicação no mercado literário brasileiro e suas estratégias para se tornar conhecido.
O Estado – Escrever No zoológico de Berlim partiu de uma visita que você fez ao local, onde até meados do século passado africanos, indígenas latino-americanos e esquimós eram expostos como atração. Qual foi sua primeira impressão sobre o “espetáculo”?
Guido Viaro – Antes de achar uma coisa abominável, foi uma grande surpresa por uma história assim tão chocante não ter chegado aos ouvidos do Ocidente. Depois da visita, voltei ao Brasil e aquilo ficou na minha cabeça. Resolvi pesquisar sobre o assunto e descobri que a coisa era muito mais comum do que eu imaginava. Praticamente todos os zoológicos da Europa mantinham pessoas presas, assim como Nova York.
Essas experiências do final do século XIX até o início do século XX eram de pessoas capturadas contra a vontade na África, América do Sul ou em outros lugares. Qualquer um que fosse diferente do europeu podia ser exposto a visitação. Grande parte dessas pessoas morria na longa viagem de navio por conta da diferença de clima.
Não eram prisioneiros perpétuos, ficavam por um período de exibição determinado, até que se encerrasse a novidade, geralmente em torno de um ano, período no qual mais da metade morria. Era uma época de grandes mudanças, porque os impérios estavam desmoronando e estavam surgindo as repúblicas. Estavam sendo desenhadas as primeiras noções de direitos civis. Hoje, as instituições existem e são falhas, mas naquela época elas nem existiam.
OE – E quando surgiu a ideia de fazer o livro a partir?
GV – No momento em que fiz as primeiras pesquisas já veio a ideia para o livro, que não é uma ficção só sobre essas experiências. Utilizo o esqueleto desse momento triste da História para abordar muitas outras coisas. Falo, nas entrelinhas, do aprisionamento de todos os seres humanos, da falta de liberdade das pessoas, dos pesos sociais que todo mundo carrega sem perceber.
Deixo nas entrelinhas que todas as pessoas no mundo ocidental civilizado são prisioneiras de um sistema social, político, que nos faz viver uma vida que não é a verdadeira vida. A gente vive uma sucessão de máscaras sociais e políticas. A ética individual de cada um deveria ser a única lei vigente.
Se cada ser fosse rigorosamente ético, não haveria necessidade de tanta lei, polícia e normatizações de todo tipo, porque o ser plenamente ético é generoso, então os atritos seriam resolvidos por essa generosidade universal. Embora pareça algo muito utópico e distante, é nisso que eu acredito. Lentamente, ao longo dos séculos, a humanidade caminha nessa direção.
OE – Abordar essas prisões a que o ser humano está submetido é um tema presente também em obras anteriores suas. Mesmo que em outras histórias e contextos, são as mesmas prisões, num sentido mais amplo. Você pretende continuar a desenvolver suas obras nessa linha de pensamento?
GV – Esses meus últimos cinco livros formam um conjunto, que escrevi em dois anos e meio. É um ciclo de pensamento que se encerrou pra mim. No zoológico de Berlim é escrito como um diário do personagem aprisionado e, durante todo o livro, ele vai se questionando sobre a sua situaç&atild,e;o.
Em um dado momento, ele se pergunta se houvesse na África um zoológico para europeus, se ele não colocaria europeus lá para serem expostos e ele chega à conclusão que provavelmente sim. Detesto pessoas que, pela raça, se fazem de vítimas. Todo mundo é vítima e vilão ao mesmo tempo. Quero voltar a escrever o mais cedo possível, mas vou ascender um degrau e tratar de outros assuntos.
OE – E quais podem ser esses novos assuntos?
GV – Estou na fase de tentar formar uma ideia para um próximo livro, coletando informações genéricas, mas ainda não formulei qual deve ser a linha para a qual vou partir agora.
OE – Mesmo tendo alcançado a sua sexta publicação, você ainda não publicou por alguma editora. Por quê?
GV – Eu tentei, mas é um mercado muito fechado. Vou continuar tentando, estou totalmente aberto a conversas, mas é um meio muito difícil. O mercado editorial brasileiro já é pequeno, lê-se muito pouco no País, o livro é caro e aposta-se naquilo que tem venda garantida.
Agora estão surgindo pequenas editoras que são mais abertas ao risco e que podem ser mais um caminho. A produção brasileira hoje é muito fraca e as pessoas boas são desconhecidas do grande público. O que é sucesso são os velhos clássicos, que tem qualidade, ou é algo muito comercial, televisivo ligado à imagem.
OE – Por isso a sua opção de enviar seus livros, ao longo dos anos, para bibliotecas de todo o Brasil?
GV – Sim, é uma alternativa. Já enviei meus livros para cerca de 800 bibliotecas e, nos próprios livros, eu divulgo meu site (www.guidoviaro.com.br). O site serve também para dar retorno dos leitores. Muitas pessoas lêem nas bibliotecas e me escrevem, de diversas cidades.
OE – Autores independentes estrangeiros disponibilizam seus livros para download como forma de se tornarem conhecidos e de aumentar suas vendas, não de prejudicá-las, pois acreditam que a maioria das pessoas que baixam não comprariam os livros. Você compartilha dessa opinião?
GV – Deixo os livros na internet para popularizar. Não tenho nenhuma ajuda financeira para imprimir os livros, cuja tiragem é em torno de mil exemplares, o que é bem limitado, diferente de se ter um download gratuito. Mesmo que sejam poucos que baixem, amplia consideravelmente essa tiragem. É diferente para o escritor que tem livro na livraria, meu objetivo é divulgar minha obra.
OE – E está dando certo? Como é o retorno dos leitores?
GV – O primeiro livro que lancei, em 2006, o Glória, eu enviei para 600 bibliotecas. No período de um ano, meu retorno foi de um e-mail. Depois, em 2007, tive uma média de um e-mail por mês. E agora recebo um e-mail por semana. São 50 leitores por ano que escrevem, ou seja, tem muito mais que lê. Foi uma crescida grande nesse curto espaço de tempo.