Em Cannes, no ano passado, havia grande expectativa por Filhas do Sol, que integrava a competição. A diretora Eva Husson, francesa de Le Havre, chegou com um discurso militante, nessa época de empoderamento. “Meu filme não é sobre a guerra curda, é sobre as mulheres na guerra.” E isso faz toda a diferença. Filhas do Sol é sobre um pelotão formado só por mulheres. A líder do grupo é Bahar, interpretada por Golshifteh Farahani. Com o grupo, segue a fotojornalista Mathilde, e quem faz o papel é Emmanuelle Bercot. Em 2015, ela fez história em Cannes ao ser selecionada para a abertura com De Cabeça Erguida, que dirigiu, e ao vencer o prêmio de interpretação por Meu Rei, de autoria de outra atriz e diretora, Maïwenn.
A guerra é essencialmente um gênero masculino no cinema. Poucas mulheres se aventuraram a contar essas histórias, mas já o fizeram. Kathryn Bigelow chegou a ganhar o Oscar por Guerra ao Terror (derrotando o ex-marido, James Cameron, que concorreu com ela por Avatar). Eva contou ao Estado que, por mais que esteja contando histórias de mulheres, sua fonte de inspiração foi um homem. “Meu avô foi soldado republicano na Guerra Civil espanhola. Manteve os ideais, apesar da derrota, e a vida toda me contava histórias, de como as ‘compañeras’ haviam sido valorosas. Quando descobri a luta das mulheres curdas, senti que poderia falar sobre ideais e poder feminino. Emmanuelle e Golshifteh embarcaram nessa história comigo. São duas mulheres de temperamento muito forte.”
O filme vai direto ao ponto – Golshifteh e suas combatentes vão à luta contra o Daesh, Estado Islâmico do Iraque e do Levante. Bahar leva uma guerra particular – nessa cidade, ela foi feita prisioneira e conheceu o horror nas mãos de homens brutais. E eles ainda estão de posse do filho dela. Ao mostrar a luta de mulheres, o roteiro privilegia questões como a maternidade. Diz a diretora: “É um pouco nosso diferencial. Bahar luta pelo filho, outra combatente dá à luz durante um combate mais duro. Gosto dessas situações, não são coisas que os homens costumem mostrar”.
Sua grande preocupação foi com o realismo de cena. “Fiz o filme pensando no público. Lutei muito para ter orçamento, para filmar tomadas aéreas que situem o espectador na geografia da ação. Um jornalista reclamou do excesso de música, outro, da câmera lenta para distender os tiros e seu impacto nas pessoas. Tudo foi intencional. Utilizo muito os closes porque me parece importante compartilhar tanto sofrimento. Essas mulheres são heroínas. Torço por elas, e espero criar as condições para que o público também torça.” Boas intenções à parte, o filme foi vaiado na sessão de imprensa.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.