Ninguém tinha dado atenção a Green Book – O Guia até ele estrear no Festival de Toronto, em setembro, e imediatamente entrar para os prováveis candidatos do Oscar – uma previsão que se confirmou ontem, com as cinco indicações recebidas. O longa também ganhou três Globos de Ouro, de melhor musical ou comédia, roteiro e ator coadjuvante (Mahershala Ali), além do prêmio do Sindicato dos Produtores, um dos principais termômetros para o Oscar.
Green Book – O Guia inspira-se numa história real. Nos anos 1950, com o Sul dos Estados Unidos ainda sob segregação racial, havia um guia de hotéis que aceitavam negros, o “green book” do título. Em geral, eram estabelecimentos bem simples.
Quando o pianista negro Don Shirley (Ali), um homem rico e refinado, resolve fazer uma turnê pela região, a gravadora contrata um motorista leão de chácara, Tony Lip (Viggo Mortensen), um ítalo-americano falastrão e racista. A viagem, claro, não começa muito bem. Mas aos poucos os dois desenvolvem um relacionamento próximo. “É um roteiro muito bem escrito, muito bem estruturado, com personagens bem desenhados. Eu ria alto quando estava lendo”, disse Mortensen em entrevista durante o Festival de Zurique, no início de outubro. “Mas também provoca, fala de questões importantes como racismo e diferenças de classe.”
Apesar de tratar de assuntos sérios, Green Book tem bastante humor e é quase um “feel good movie”, um filme reconfortante. Seu diretor é Peter Farrelly, conhecido por comédias escrachadas como Quem Vai Ficar com Mary? e Débi & Loide – Dois Idiotas em Apuros, dirigidos em parceria com seu irmão, Bobby Farrelly. Green Book – O Guia é o primeiro filme que Peter dirige sozinho, sem Bobby. Mas o diretor disse que não foi nada planejado. “Essa história caiu no meu colo, foi sorte”, contou Peter. “Um amigo meu, o ator Brian Currie, me contou essa história inacreditável. E aquilo ficou na minha cabeça. Dois meses depois, liguei para ver como estava indo e me ofereci para me juntar ao projeto.” Ele deixou claro que foi uma exceção e não uma tentativa de separação de Bobby. “Não tinha intenção nenhuma de fazer sozinho. Mas o filho do meu irmão morreu há quatro anos de overdose, e ele ficou totalmente abalado.”
O cineasta disse que não achou Green Book tão diferente dos seus outros longas. “Nossos filmes tinham um tom e coração. Em alguns instantes tive de me conter diante de algumas piadas, mas foi isso.”
O longa não poderia ser mais atual, concordam Mortensen e Farrelly. “As coisas não mudaram tanto assim”, afirmou o ator. “Houve uma época em que a mobilidade entre classes era maior, mas agora existe uma enorme diferença entre ricos e pobres.” Farrelly não concebeu o filme como uma mensagem. “Gostei desse ‘bromanc’ entre esses dois homens tão diferentes”, garantiu o cineasta. “Se você se coloca no lugar do outro ou simplesmente conhece o outro e supera o medo do diferente, você vê que somos muito parecidos.”
O filme, que desponta como favorito na disputa do Oscar de melhor filme depois do prêmio do Sindicato dos Produtores, agora tem de superar as controvérsias em que se envolveu desde então, como o uso de uma palavra preconceituosa por Viggo Mortensen, a divulgação de que o diretor, no passado, costumava baixar as calças para fazer graça no set ou o tweet de Nick Vallelonga, roteirista, produtor e filho de Tony Lip, falando mal de muçulmanos – o ator Mahershala Ali segue a religião. Além disso, precisa superar a fama de ser um Conduzindo Miss Daisy ao contrário e de usar mais uma vez um “salvador branco” para contar a história de um negro. A família de Don Shirley acusou o filme de falsear vários aspectos, incluindo exagerar a amizade do músico com Lip.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.