Um homem e uma mulher, separados há 19 anos, se reencontram apenas para formalizar o divórcio. É a história de “A Última Tarde”, do peruano Joel Calero. Enquanto esperam pelo juiz, o homem e a mulher dão um passeio pelas redondezas do fórum, em Lima. É como se fosse uma “DR” póstuma, já que os dois estão separados, se casaram de novo, tiveram filhos etc.

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Acontece que existe algo a mais no passado deste ex-casal. Laura (Katherina D’Onofrio) e Ramón (Lucho Cáceres) foram militantes do Sendero Luminoso, mas de maneira um tanto assimétrica. Ele era o mais radical e profundamente envolvido com a luta armada. Pagou por isso. Ela, filha de família rica, acabou aderindo talvez pelo amor a ele e menos por convicção política. Essa tensão está em jogo em tudo que falam, embora não se refiram ao assunto de forma direta, a não ser a partir de certo ponto.

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O diretor capricha na linguagem cinematográfica. Por exemplo, logo que os dois saem à rua são seguidos por uma câmera frontal num longo plano sequência (sem cortes). Não contei, mas me pareceu ser de mais de 10 minutos, o que cria dificuldades não apenas para a filmagem, o manejo da câmera, foco, fotografia, etc, mas para os atores, que têm de recitar o texto em tempo real.

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Essa opção pelos planos sequência e diálogos intimistas lembra um pouco o cinema de Eric Rohmer, porém acrescido de conteúdo político explosivo. O mestre da nouvelle vague francesa dominava como ninguém esse tipo de conversa sem cortes que, com a aparência de não levar a lugar nenhum, acaba por desvelar a intimidade dos personagens. Aqui, além das feridas pessoais não cicatrizadas, há a questão política candente e ainda não resolvida no país.

Essa mescla de contingências históricas e vida pessoal, finamente entrelaçadas, e filmadas de maneira tão incisiva quanto elegante, faz a força deste filme surpreendente. No meu modo ver, “A Última Tarde” é, até agora, o favorito para vencer o prêmio de melhor filme latino. Atriz e ator são magníficos.