Gata Mansa em silêncio

Quatro dias depois de dar entrada no Hospital Miguel Couto, zona sul do Rio, vítima de acidente vascular cerebral (AVC), morreu às 20h da última quinta a cantora Marisa Gata Mansa, de 69 anos. O corpo foi sepultado ontem no cemitério São João Batista, em Botafogo, na presença de parentes e amigos.

Praticamente esquecida nos últimos vinte anos, Marisa Vértulo Brandão entrou no showbiz no início dos anos 50 pelas mãos de João Gilberto, que a considerava uma das mais belas vozes do mundo. Estreou em disco em 1953, aos 20 anos, cantando uma das raras músicas do compositor bissexto, Você Esteve com Meu Bem.

Marisa virou Gata Mansa por causa do jeito aspirado de falar, quase como quem sussurra – emissão muito diferente daquela revelada pelo canto, voz vigorosa, potente, meio-soprano de timbre quente e liso.

Foi uma das mulheres mais belas de seu tempo. Morena de olhos claros, corpo do tipo violão, simpatia irradiante, talento imenso, honestidade profissional a toda prova -Marisa tinha todas as qualidades que se possa exigir de um artista.

Cantora de boate durante praticamente toda a vida profissional, Marisa começou cantando jazz e em pouco tempo – antes de alcançar a maioridade – era crooner do Golden Room do Copacabana Palace, posto que ocupou por quatro anos.

Tornou-se amiga íntima de Dolores Durán, que era amiga de João Gilberto – e assim João ouviu Marisa cantando, em 1954. Levou-a para a boate Midnight e, depois, para as casas do Beco das Garrafas, em Copacabana, onde a bossa nova ia sendo inventada.

Sucesso

Marisa era um sucesso. Lotava casas e tinha admiradores fervorosos – mas, curiosamente, seus discos, não muitos, mas todos ótimos, nunca repetiam o êxito obtido em cena. Elas teve um grande sucesso em 1964, quando gravou a canção Viagem.

A música também lançou dois brilhantes compositores: o violonista João de Aquino (primo de Baden Powell) e o letrista Paulo César Pinheiro, que, quando escreveu aqueles versos, não tinha ainda 15 anos.

No fim dos anos 60, Marisa foi para São Paulo, onde morou por quase uma década, fez teatro e dividiu um espetáculo com Caetano Veloso e Taiguara. Em 1979 voltou a cantar na boate Fossa, no Rio, onde havia sido cantora titular por muitos anos.

Sem gravadora, em 1982 fez um disco independente, Leopardo, que teve distribuição precária e virou item de colecionador. Marisa relançaria o disco, ainda de forma independente, dez anos depois, acrescentando às faixas originais uma regravação de Viagem.

Mas a voz já não era a mesma. Marisa havia sofrido um derrame, em 1987. Ficou alguns meses internada num hospital em Niterói e a recuperação, lenta, nunca foi total. Ainda assim, em 1997, lançou um belíssimo disco em que homenageava outro grande amigo: o CD Encontro com Antonio Maria. Seu talento musical perpetua-se com o filho Marcelo Mariano, contrabaixista e compositor, filho dela com o pianista César Camargo Mariano.

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