Tem gente que até hoje considera o fato de Marianne Faithfull não haver recebido o prêmio de melhor atriz por Irina Palm uma das maiores injustiças da história do Festival de Berlim. Nascido na Alemanha e naturalizado belga, Sam Garbarski é o diretor e, segundo a própria definição, o filme é “uma tragicomédia romântica e politicamente incorreta”. Marianne faz a vovó com mãos de fada que se emprega como masturbadora (sim!) numa casa de sexo. Dessa maneira, espera reunir o dinheiro para pagar a cirurgia do neto. Garbarski continua incorreto no novo longa, mas, desta vez, o assunto é mais grave.

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Bye Bye Alemanha é sobre um judeu que, em 1946, logo após a guerra, espera reunir dinheiro – sempre ele a impulsionar os personagens do autor – e migrar para os EUA. Em busca do visto, o personagem de Moritz Bleibtreu é investigado por uma agente norte-americana. Há suspeita de que ele tenha sido colaboracionista no campo de extermínio, ao qual conseguiu sobreviver. Nazismo, judeus, Holocausto, humor. Toda essa mistura é delicada, não raro explosiva, ainda mais para quem professa a incorreção como norma, como é o caso de Garbarski.

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A vida no mesmo período da Alemanha já foi tema de Christian Petzold em Bárbara, em que Nina Hoss fazia uma plástica e, com a cara transformada, se envolvia com o marido suspeito de havê-la entregue aos nazistas. Agora, no momento em que o tema das migrações causa tumultos diários em toda a Europa, Garbarski talvez surpreenda ao mostrar esses judeus que regressam à Alemanha, que os tratou tão mal.

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Bleibtrau arregimenta o grupo e, a despeito de toda a miséria que acometeu/atormentou seu povo – a família morreu em Auschwitz -, nunca perde a alma de gozador. Nem no campo resistia a fazer uma piada.

Sua fama de colaborador vem daí e ele tenta explicar à agente que só estava tentando sobreviver quando o diretor do campo resolve enviá-lo a ninguém menos que Adolf Hitler, para ensinar ao ‘führer’ o segredo do bom humor. Seu mantra é “Hitler morreu e nós estamos vivos”.

Garbarski não resiste a mostrar Bleibtreu explorando o grupo que vende roupa de cama supostamente de Paris a alemães que tentam apaziguar a má-consciência e agora são eles, na rota inversa, que colaboram com as antigas vítimas. Nem de longe tão bom quanto Irina Palm, Bye Bye torna-se aceitável por fazer observações interessantes sobre as complicações da vida alemã após a derrota nazista. O país que, como fênix, se reergueu das cinzas foi retratado por Rainer Werner Fassbinder em O Casamento de Maria Braun. Pelo tom, Garbarski passa a impressão de conhecer bem a obra de Fassbinder.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.