Vinte e cinco anos depois de seu primeiro longa-metragem, Gaijin, Tizuka Yamasaki volta novamente ao tema da imigração japonesa, desta vez com o subtítulo Ama-me como Sou. Nessa longa saga, Tizuka conta a história dos seus ancestrais, desde o desembarque no Brasil, as dificuldades de adaptação, o jogo de cintura necessário para driblar as vicissitudes da política doméstica, como o Estado Novo. E, finalmente, o toque contemporâneo, a inversão do fluxo migratório, com os descendentes dos japoneses tentando ganhar a vida no país dos seus ancestrais.
A saga dos dekasseguis poderia ser o ponto de maior originalidade deste Gaijin, mas infelizmente é a parte mais fraca do filme, quando ele abandona o tom algo suntuoso da primeira parte e adota uma linguagem televisiva, novelesca e próxima do melodrama.
Não há nada de errado no tom épico empregado na primeira parte.
Afinal, toda saga de imigração é mesmo épica e o tom solene pode ser empregado à vontade, desde que funcione. O filme todo soa como que contaminado por alguma aspiração interna de grandeza da diretora, que acaba não se realizando na tela. Nem mesmo alguns planos suntuosos, com ostensivo uso de gruas, parecem escapar da artificialidade. Ou seja, anulam-se em sua grandiloqüência.
A direção de arte elaborada, acima da média em produções nacionais de época, não consegue evitar a sensação de distanciamento que o espectador sente em relação a essa primeira metade do filme. Talvez contribuam para essa situação os diálogos pouco críveis e um elenco também pouco afinado. Enfim, não que isso sirva de escusa à diretora, mas são tantos os elementos a serem bem conjugados num projeto desse porte, que a probabilidade de algo desandar está sempre presente. E, infelizmente, nesse tipo de filme, o que está fora de lugar sempre sobressai em relação ao que parece justo e correto.
Tampouco a inversão da perspectiva da história dá resultado. Pelo contrário. Quando uma das descendentes se casa com um ocidental, um "gaijin", é que as coisas desandam de vez. Interpretado pelo cubano Jorge Perugorría, e dublado pelo brasileiro Chico Diaz, esse gaijin irá ao Japão, onde se torna homem de negócios, numa trama rocambolesca que não convence ninguém. Aqui, a comparação com um épico recente também é desfavorável. Em América – Tempo de Chegar, Gianni Amélio mostra de forma dramatúrgica, a contradição que existe no fato de os italianos, um povo de emigrantes no século 19 e início do 20, hoje discriminarem os imigrantes albaneses que chegam à Itália.
Esse silogismo humanístico nunca é alcançado por "Gaijin – Ama-me como Sou", apesar de esta ser a aparente intenção: os primeiros imigrantes japoneses sentem-se estranhos no Brasil e seus descendentes sentem-se estranhos ao voltarem ao Japão. Essa "estranheza" cruzada não passa de xenofobia, localismo e bairrismo, essas doenças infantis do nacionalismo. Somos todos uma humanidade só. Ou assim deveria ser, como indica o subtítulo "Ama-me como Sou", tirado de uma música de Pablito Milanês. Só que a boa intenção fica no caminho.
O tom solene da primeira parte parecia apenas pesado demais e pouco manejável pela diretora. Já essa segunda parte, o regresso ao Japão, com dados atuais como o confisco da poupança por Collor e o terremoto de Kobe, parece francamente insustentável do ponto de vista cinematográfico. Essa trama feita de poucos elementos intelectuais nunca alcança a emoção, que seria o seu fator de compensatório. Sem uma coisa, nem outra fica-se com muito pouco saldo para tanto esforço e dinheiro. Pena.