Como toda pessoa nascida na Suíça, Sabine Gisiger foi obrigada a ler na escola a obra de Friedrich Dürrenmatt (1921-1990), composta de peças como A Visita da Velha Senhora (1956) e Os Físicos (1962), e de romances como O Juiz e Seu Carrasco (1950) e Justiça (1985). “Ele abriu os olhos de muita gente. Falava que o mundo era muito maluco, e era o que eu sentia quando jovem”, disse a diretora do documentário Dürrenmatt – Eine Liebesgeschichte, exibido no 11.º Festival de Zurique. “Ouvir um escritor e pensador tão famoso dizer isso foi libertador. Para ele, a única maneira de enfrentar essa loucura era tomar distância por meio do humor. É uma boa dica para a vida.”

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Gisiger já tinha feito um documentário para a televisão sobre o escritor mais famoso da Suíça e um dos grandes pensadores do país no século 20.

“Infelizmente seu diagnóstico da sociedade no século passado permanece válido neste. Ele dizia que tínhamos feito tanto progresso na tecnologia, e, ainda assim, metade da população do mundo passava fome.” Mas, desta vez, como indica o subtítulo Eine Liebesgeschichte (na tradução do alemão, “Uma História de Amor”), resolveu focar na sua praticamente desconhecida vida privada. “Queria que as pessoas o apreciassem por tudo o que era e não apenas pelos livros que todo o mundo precisa ler na escola. Ele é muito mais do que isso”, afirmou a cineasta. Para Gisiger, Friedrich Dürrenmatt era um típico homem do século 20. “Ele era muito reservado, como a maior parte das pessoas daquela época. E fazia parte de uma sociedade mais patriarcal, em que, mesmo se sua mulher opinasse sobre seu trabalho, isso não era mencionado.” No filme, fica clara a importância em sua vida e obra de sua primeira mulher, Lotti Geissler, morta em 1983.

Gisiger pesquisou arquivos de vídeo e áudio, reunindo um total de 80 horas de material. Uma boa parte veio do filme Portrait Eines Planeten, dirigido pela segunda mulher do escritor, Charlotte Kerr (1927-2011). Mas essencial mesmo era a participação da família de Dürrenmatt – Peter, Barbara e Ruth, seus filhos com Lotti Geissler, e sua irmã Verena. “Os anos 1950 e 1960 eram muito machistas, ele quase não falava da família”, disse Ruth, que esteve em Zurique para a estreia do longa-metragem. “A mulher e os filhos ficavam como pano de fundo, ele era o grande homem. Gisiger é uma mulher do século 21. As coisas mudaram.” Ruth Dürrenmatt contou que descobriu coisas sobre seu pai por causa do documentário. “Ele sofria provocações por ser filho de um pastor e tinha de se esconder das outras crianças. Eu sofria a mesma coisa por ser filha de um escritor. Sempre tinha de me esconder.”

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A família não aceitou participar de imediato. “Não foi fácil convencê-los, tivemos muitas conversas. Eles raramente falavam sobre seu pai e seu irmão, mas confiaram em mim”, disse Gisiger. Ruth Dürrenmatt afirmou que só topou depois de seus irmãos e sua tia decidirem participar – Barbara só não aparece no filme, segundo Gisiger, porque odeia estar na frente das câmeras.

“Se eu fosse mais jovem, não sei se teria feito. Mas fiz tantas coisas: pinturas, poemas, desenhos, música. Vi de tudo. No percurso da vida, você acaba perdendo a chupeta, deixa de ser um bebê”, disse Ruth, que comparou seu pai a uma grande árvore. “Cresci sob sua sombra. Mas a gente sempre precisa se lembrar de que as trufas não nascem sob o sol, e, sim, na sombra. Mas elas são muito caras!”, completou, rindo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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