Fotos de Martín Chambi mostram ‘verdadeiro povo’

Índio, burguês, flâneur, intelectual, primitivo, artista, espectador extasiado. O fotógrafo peruano Martín Chambi (1891-1973) saiu de uma cidade muito pequena e muito isolada às margens do Lago Titicaca, com seus 16 anos, vindo de uma família indígena quéchua, para se tornar a grande testemunha visual do nascimento de uma nação, nos primeiros anos do século 20.

A mostra Face Andina, que o Instituto Moreira Salles abriu nessa quinta-feira, 2, em sua sede, traz algumas das obras mais importantes de Chambi, pelas quais se pode acompanhar seu percurso e suas revelações. São 88 fotografias (ampliações feitas a partir dos negativos de vidro originais) e 23 postais inéditos, encontrados recentemente pela curadoria em 6 álbuns comprados de um colecionador.

Muitos se debruçaram sobre o esplendor das fotos de Chambi, que são maravilhosas. Para Mario Vargas Llosa, Chambi “desnudou a complexidade social dos Andes”, entre outros méritos. O lote apresentado pelo Instituto Moreira Salles é um recorte que ilustra desde as origens do fotógrafo até os exemplares mais emocionantes do seu orgulho étnico.

Passando por festividades, casamentos, paisagens (como sua primeira visão do Caminho Inca) e cenas cotidianas populares, até chegar a seu período de maior reconhecimento profissional (quando teve um estúdio e começou a fotografar famílias burgueses), Chambi tinha um único objetivo, que era “conhecer e me confundir com o verdadeiro povo”, além de imaginar um Peru “finalmente nosso”. Tinha, portanto, um princípio ideológico.

“Ele nunca deixou de fotografar o povo andino, era um militante da valorização de sua gente”, diz a curadora da exposição, Mariana Newlands. Mas Chambi fazia isso, esclarece a curadora, sem idealizar nem romantizar nada. Ele via com afetuosidade e carinho seus conterrâneos, mas não dourava a pílula. Essa característica “crítica”, por assim dizer, de sua obra acaba por destacar elementos da dominação econômica, da submissão cultural, o espírito duro do progresso, as aspirações de classe social, assim como também do legado da terra.

Chambi aparece em vários momentos da exposição, eram comuns seus autorretratos. O que ilustra essa página mostra o fotógrafo olhando para um negativo de si mesmo como um Hamlet do altiplano, mas há também fotos suas em motocicletas e ao lado de sua mula no alto de uma montanha – o peso do equipamento era tamanho que ele precisava dos animais para se locomover, e ainda assim o fazia como um atleta.

Chambi começou estimulado pelo fascínio que sentiu ao ver os fotógrafos das mineradoras de ouro da região em que cresceu. Por ambição profissional, foi ainda garoto para Arequipa, onde teve como mestre outra lenda peruana, Max T.

Vargas. Tornou-se um dos primeiros fotógrafos a registrar a cidade de Machu Picchu, descoberta em 1911, e teve fotos publicadas em outros países, como no jornal argentino La Nación e na National Geographic.

Sua obra se fez cult no mundo todo, o que ajudou a família a recuperar seu legado (hoje, estimam-se em 30 mil os negativos existentes no Arquivo Fotográfico Martín Chambi). Seu triunfo é a vitória de milhares de peruanos anônimos, que tornaram-se parte do retrato de formação de seu país. “Havia conseguido ser mais um cusquenho em Cusco, querido e respeitado por pessoas importantes e simplórias, ricos e pobres. Minhas fotografias eram a causa, e minha identidade ancestral, minha inspiração.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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