A relação entre o dramaturgo Evaldo Mocarzel e o Teatro da Vertigem continua a gerar frutos. Depois de escrever Kastelo – que o grupo encenou em 2010 -, o autor agora assina Fome de Notícia. O espetáculo, que estreia nesta sexta-feira, 6, no Centro Cultural São Paulo (CCSP), tem direção de Maurício Perussi, encenador assistente da montagem Bom Retiro, 958 metros, que resolveu encenar o texto depois de apresentá-lo dentro de um Ciclo de Leituras Dramáticas do Teatro da Vertigem.

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“Antônio Araújo (diretor do Teatro da Vertigem) assistiu a essa primeira encenação da peça e nos incentivou a estrear”, conta Mocarzel. “Ele também nos deu uma contribuição importante, chamou a minha atenção para a ausência do meu depoimento pessoal como jornalista. O que está presente nessa versão que apresentamos agora.”

Além de dramaturgo e documentarista, Mocarzel teve uma longa carreira no jornalismo e foi, inclusive, editor do Caderno 2 do jornal ‘O Estado de S. Paulo1. Para concretizar sua intenção de amarrar desejo e morte em uma mesma obra, ele se valeu daquilo que viu e viveu por mais de 30 anos dentro das redações. “O jornalismo, no geral, é muito mal retratado. Surge sempre de uma maneira maniqueísta, estereotipada”, observa ele. “Todo esse tempo passado dentro do jornal decantou nos meus nervos, para o bem e para o mal. Aprendi a resolver qualquer problema em tempo recorde. Mas também estive em contato com um antro de cinismo – traço que os jornalistas exacerbam até como instinto de defesa.”

Em Fome de Notícia, a situação retratada é a de um homem e uma mulher que encobrem suas vidas com aquilo que veem e leem nos meios de comunicação. “É um casal de classe média paulistano que vampiriza as tragédias da mídia para sublimar o próprio vazio”, observa ele. “E eu conheço muita gente assim, que se alimenta diariamente dessas notícias de crimes. Existe uma camada pessoal que eu também quis exorcizar aí.”

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Ainda que convoque muito de sua vivência e de sua capacidade de observação para a composição da peça, Mocarzel preferiu revesti-la de carga expressionista – traço estético, aliás, que surge de forma recorrente em suas criações, como Tragicomédia de Um Homem Misógino, Satyricon e Kastelo. “Tem um lado obscuro da alma humana que o expressionismo me ajuda a capturar muito bem, que eu encontro sempre que volto a certos filmes alemães, como Gabinete do Dr. Caligari. Estamos mostrando uma espécie de reality show macabro”, diz ele sobre o espetáculo, em que atuam João Attuy, Marco Biglia e Sofia Boito e no qual elementos da vida cotidiana se mesclam a objetos e referências dos noticiários e dos estúdios de televisão. Além do casal, aparece em cena a figura de um contrarregra.

FOME DE NOTÍCIA – CCSP. Sala Ademar Guerra. Rua Vergueiro, 1.000, Paraíso, 3397-4001. 6ª e sáb., às 21 h; dom., às 20 h. R$ 20. Até 29/9.

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As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.