Sucesso mesmo, até agora, foi o de “Os Últimos Cangaceiros”, documentário que obviamente não está concorrendo pois é de autoria de Wolney Oliveira, diretor do Cine Ceará. Mas o prêmio da consagração pública ele já levou com a sua história do cangaço baseada em depoimentos de Moreno e Durvinha. Mortos após as filmagens, em idade já bem avançada, os dois fizeram parte do grupo de Lampião. Moreno chegou aos 100 anos de idade.
A história do casal é incrível. Ambos entraram para o cangaço depois de injustiças sofridas, como costuma ser o caso, ou, pelo menos, a lenda. Durvinha, após uma infância de maus-tratos em família; Moreno, depois de levar uma enorme surra da polícia. No bando, Durvinha foi casada primeiro com Virgino, de quem Moreno era uma espécie de segurança. Com a morte do chefe, Moreno “adotou” Durvinha, e juntos ficaram pelo resto da vida.
Depois da morte de Lampião, Moreno e Durvinha resolveram empreender fuga pelo sertão, para escapar das volantes. Percorreram quase dois mil quilômetros em três meses de andança, e foram se instalar em Minas Gerais. Lá adotaram os nomes de José Antonio Souto e Jovina Maria da Conceição. E assim viveram em segredo, por mais de 70 anos. Nem os filhos sabiam do seu passado, até que um dia Moreno resolveu revelá-lo a uma das filhas.
A saga não esconde o que havia de criminoso na vida do casal, de Moreno em particular. Ele mesmo diz se lembrar de 21 mortes nas costas, além de violências praticadas contra homens e mulheres. Em Minas, “regenerado” do cangaço, dedicou-se à exploração do lenocínio. Diz que não lamenta coisa nenhuma do que fez. O especialista Frederico Pernambucano de Mello (autor do fundamental Guerreiros do Sol) diz no filme que Moreno era uma figura importante do grupo de Lampião, violento ao extremo, aquele que se ocupava do serviço sujo do bando.
“Os Últimos Cangaceiros” é um filme sedutor em sua estética. Além das entrevistas e dos encontros dos velhinhos com filhos dispersados pelo mundo, usa material de arquivo com sabedoria. Filmes documentais e de ficção são incorporados numa montagem esperta e com trilha sonora do DJ Dolores, compondo uma obra ritmada e visualmente muito agradável.
A violência que, no entanto, é confessada pela própria boca dos personagens, coloca um contraponto interessante a tanta sedução. Sempre se incorre no risco de mitificar a figura do cangaceiro, recorrente no cinema nacional. Pela indumentária enfeitada, e aura de “bandido social”, às vezes o cangaceiro é confundido com uma espécie de Robin Hood do sertão, o que corresponde pouco à realidade. Por sorte, Wolney não cai nesse engodo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.