Dois, dentre os mais importantes eventos profissionais de dança do Brasil, acabam de ocorrer: a 9ª edição do Festival Contemporâneo de Dança – FCD, em São Paulo, e a 21ª do Fórum Internacional de Dança – FID, em Belo Horizonte. Ambos expõem, cada um a seu modo, questões que não lhes são exclusivas, pois dizem respeito à crise que golpeia a dança que se produz no Brasil.

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Esta crise se revela nos violentos cortes de seus orçamentos, que cada um deles teve a habilidade de comunicar na forma de uma manifestação política. Suas programações-manifestações convocam uma reflexão coletiva sobre o que não pode mais ficar sendo normalizado.

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O FID juntou Sandra Meyer, Diana Gilardenghi, Margô Assis, Waldete Brito, Thereza Rocha, Thembi Rosa, Carmen Luz, Jorge Alencar, Neto Machado e Márcia Milhazes e um único estrangeiro, Benoît Lachambre, artista canadense que o próprio FID apresentou ao Brasil em 1993 e que, até hoje, não faz parte do circuito midiático das celebridades internacionais. Adriana Banana, uma das duas fundadoras do FID (a outra, Carla Lobo, desligou-se do projeto há dois anos), montou um mapa do Brasil que desenha algo como uma ‘geopolítica estética’, que surpreende ao colocar em convivência representantes de nichos que se desconhecem e, nem sempre, se respeitam.

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Para não deixar dúvidas sobre a importância da escolha de seu tema para 2016, O Risco do Nome, arriscou duas propostas: discutir formas diversas de apresentar espetáculos e colocar o seu próprio nome na programação. Pela primeira vez, em 21 anos, programou a sua companhia, a Ur=Hor para, com esse gesto, nos convocar a pensar para o que serve ser programado em um festival quando essa inclusão não traz o impulso necessário para a emancipação, para a independência da condição de continuar a ser excluído da possibilidade de futuro.

Por esse ponto, sintoniza-se com o FCD, que também programou uma ação de Adriana Grecchi, criadora do festival em parceria com Amaury Cacciacarro. A Plataforma Exercícios Compartilhados, idealizada por ela, reuniu 20 artistas nesta, que foi a “edição de resistência” do FCD. O festival só pôde se realizar porque artistas pagaram passagem e renunciaram a seus cachês, assim como a equipe técnica. Juntos, nos levaram a ver que, dessa vez, era fundamental fazer o FCD acontecer para expor que a programação que estava sendo realizada apontava para aquela que não pôde acontecer. Assim, mostrou que a nós caberia perguntar até quando a dança se conformará com o que está em curso?

Com o corte de 80% de seu orçamento, a progamação do FCD ficou reduzida à Mostra Wagner Schwartz, que apresentou La Bête (O Bicho), Piranha e Transobjeto, três obras fundamentais para se compreender a produção de dança no Brasil de hoje; Satélites, da dupla de artistas independentes portugueses Sofia Dias e Vitor Roriz; e Sakinam, que Christian Rizzo dança e criou com o bailarino turco Kerem Gelebek. Além de exibirem os trabalhos, os dois festivais realizam workshops com os artistas que trazem.

A abertura do FCB foi realizada pelo Terreyro Coreográfico no Centro de Referência da Dança – CRD. Foi uma Celebração, uma espécie de ritual coreográfico que antropofagizou o Dia dos Mortos mexicano, o Dia do Saci e a versão brasileira para o Dia das Bruxas. O Terreyro defumou as instalações do CRD e fez uma “limpeza” simbólica dos seus arredores com música, dança e comida.

A Celebração foi contestada pelo Fórum Permanente de Danças Contemporâneas – Corporalidades Plurais e haverá uma nova reunião, também no CRD, com o tema Racismo, Apropriação e Estigmas na Dança: um debate necessário.

Quando festivais, que são eventos circunstanciais, conseguem explodir os seus limites temporais e se inscrevem de outras formas na cidade, como o FID e o FCD fazem, tanto em Belo Horizonte como em SP, a força da vitalidade de ambos se torna um estímulo para que nos engajemos pelas suas continuidades.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.