Não se trata de nenhum tipo de venda de garagem ou superpromoção. Em “Família Vende Tudo”, filme de Alain Fresnot (de “Desmundo”, 2002, e “Ed Mort”, 1998) que chega hoje aos cinemas, os personagens sobrevivem do comércio ambulante, mas resolvem sair da pindaíba negociando uma mercadoria muito mais valiosa e sagrada: a filha. Escrachada e politicamente incorreta, a comédia levou cinco prêmios no Festival de Pernambuco, em maio deste ano, e coroou os protagonistas Caco Ciocler e Marisol Ribeiro (em seu primeiro longa-metragem). Como coadjuvantes, a trama tem estrelas do naipe de Lima Duarte e Vera Holtz, e ainda uma participação de Luana Piovani.
Uma maré de problemas financeiros e azar arrasta a família de Ariclenes (Lima Duarte, em papel que leva o nome real do ator)e Cida (Vera Holtz) para o fundo do poço. Sem emprego fixo, pai e mãe apelam a um empréstimo do agiota da comunidade para comprar muamba no Paraguai. As compras são um sucesso, mas a mercadoria acaba apreendida numa blitz policial. Endividados e sem ter o que vender, o casal vê em Lindinha (Marisol Ribeiro), única moça da casa, a solução mais fácil.
Inicialmente, a ideia é colocar a jovem para trabalhar em uma casa noturna como hostess, mas tudo muda quando o irmão, Webster (Robson Nunes), comenta de um testemunho que ouviu na igreja, sobre uma mulher que engravidou de um famoso e passou a receber uma bela pensão. A história faz Lindinha logo pensar no ídolo, o cantor Ivan Carlos (Caco Ciocler) para o golpe da barriga. A tal convertida, aliás, é interpretada Marisa Orth, em participação curta, mas hilária. Mais para frente, será outra convidada, Beatriz Segall, que levará o público ao riso.
Mas Ivan Carlos, criador do “xique” – um ritmo cheio de rebolado que mistura lambada, axé, funk e sertanejo, em músicas repletas de conteúdo sexual e refrões-chiclete -, já tem uma perua a tiracolo, Jennifer (Luana Piovani), que está cansada das traições do cantor.
Para a atriz Marisol Ribeiro, Lindinha se parece com muitas jovens reais. “É uma menina comum, que está lutando para ajudar a família. Ela não tem nenhum preconceito, é descolada na vida”, comenta ela. “Acho que o brasileiro é meio assim.”
O ambiente familiar degradado foi exatamente o que atraiu Lima Duarte, que atuou em “Lua Cheia” (1989), de Fresnot, a renovar a parceria. “É uma família peculiar, que vende tudo, porque precisa vender. Vende roupa, comida e a própria moral. A força deles me chamou atenção”, comentou o ator.
Desde as primeiras cenas, um humor fino e politicamente incorreto acompanha o longa. A família não é composta de vilões, mas de gente que trata questionamentos morais como banalidade. Os diálogos são marcados por palavrões e expressões chulas – numa cena, Cida orienta a filha sobre as melhores posições sexuais para engravidar. “É para mexer gostoso”, diz Lindinha.
Criar uma mãe com ensinamentos tão contraditórios foi um desafio para a atriz Vera Holtz. “Sou de família tradicional. Tive de inverter a lógica que eu tinha de família”, contou a atriz.
Ao longo de seus quase 90 minutos, “Família Vende Tudo” traz alguns bons momentos de comédia e brinca com o tão falado jeitinho brasileiro, às vezes exagerando na acidez. Ganha pontos também por momentos em que o roteiro foge do óbvio. Mas perde outros pela nudez, desnecessária. Por fim, são os bons atores, em figuras diferentes do que costumam fazer em trabalhos na televisão, o grande trunfo dessa produção. As informações são do Jornal da Tarde.