Três criaturas zoomórficas – com cabeças de bicho e corpo humano – executam uma coreografia em que interagem com grandes sacolas de compras. Esse balé que une o bizarro e o poético faz parte do universo do solitário e hiperconectado adolescente Robson, protagonista do espetáculo Quarenta e Duas, da Cia. Artehúmus, em cartaz na SP Escola de Teatro.
Pelo viés do nonsense, a peça da dramaturga Camila Damasceno critica o consumismo exacerbado e a violência da sociedade. “Nunca consegui olhar para esse texto de forma diferente, porque não dá para fazer isso de forma realista”, comenta o ator e diretor Daniel Ortega, que interpreta o jovem.
O texto é baseado em uma fake news difundida pela internet sobre adolescente compulsivo que morre após se masturbar 42 vezes seguidas. Com um ritmo de zapping, a encenação retrata os devaneios de Robson antes de sua morte. Os impulsos primários do subconsciente do rapaz, oprimido pelos desejos e padrões sociais, se revelam de forma grotesca.
Para compor esse clima de sonho (ou pesadelo) e de estranhamento, os diretores usaram Tim Burton e David Lynch como inspiração. “Esses cineastas trazem um lugar do inconsciente para a arte que é muito interessante”, diz o codiretor Emerson Rossini, do Núcleo Tumulto, convidado pelo amigo após Evill Rebouças, diretor da Artehúmus, não poder participar do projeto.
Em seu primeiro trabalho na direção, Ortega divide a cena com o ator Cristiano Sales. Na estreia, o papel da mãe religiosa e superprotetora, preocupada com as muitas horas gastas por Robson em frente do computador, ficou a cargo da atriz Dai Rodrigues. No restante da temporada, que termina no dia 23 de abril, a personagem é incorporada por Cibele Bissoli.
Ortega explica que a presença do látex no cenário e figurino criados por ele e Álvaro Franco serve para evidenciar o lado falso que a peça se propõe a mostrar. Partes de bonecas, serrotes, luvas cirúrgicas e regadores de plantas são outros elementos cênicos que embasam a linguagem nonsense do espetáculo.
Uma colagem sonora com nomes de marcas, trechos de comerciais, locução de telejornais e chamadas da Sessão da Tarde, tudo captado na internet, indica a profusão incessante de informações dos dias atuais. No final, há o jorro de uma garrafa de refrigerante. “A Coca-Cola é esse símbolo mor do consumo, da marca, e a gente aproveitou para usar isso”, afirma Rossini.
QUARENTA E DUAS
SP Escola de Teatro. Sala R1. Praça Roosevelt, 210, Consolação, tel. 3775-8600. 6ª, sáb. e 2ª, 21h; dom., 19h. R$ 30. Até 23/4.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.