Quase não precisamos saber de sua biografia – a dor está toda lá, em sua música. Na maneira como toca o trompete, ou no jeito que canta. Ouça, por exemplo, sua versão de standards como Stella by Starlight e My Funny Valentine (as de Miles também são impressionantes). Ou a maneira como canta Deep in a Dream of You. A dor do mundo está lá contida, de maneira pura, pode-se dizer.

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Mas, sim, claro, há a história, a biografia do envolvimento com drogas, e com a mais terrível delas, a heroína (o crack surge apenas no final dos anos 1980). Terrível porque provoca prazer extremo e fugaz. E uma crise de abstinência devastadora e longa. Teria sido numa dessas crises que Chet Baker caiu ou se atirou do seu quarto de hotel em Amsterdã? Até hoje não se sabe. Era 1988 e terminava dessa forma trágica uma carreira extraordinária de músico.

Chet, que tocou com Gerry Mulligan e Charlie Parker, desenvolveu estilo próprio. Surgido na época do bebop, final dos anos 1940, início dos anos 1950, desenvolveu um jeito cool de tocar, ao lado de atletas instrumentais. Preferia poucas notas, ao contrário de Parker e Gillespie, voltados para um exercício da profusão, da passagem por escalas improváveis, da velocidade e improvisos extraordinários. Chet não era menos inventor que eles, mas preferia um virtuosismo da economia, digamos assim.

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Há quem diga que seu estilo foi uma das influências decisivas da bossa nova, tanto na maneira de tocar como de cantar, ao lado do célebre disco de Barney Kessel com Julie London. Sim, Chet, à maneira de um João Gilberto avant la lettre, também canta de maneira econômica, baixinho, quase sussurrando. Professa esse canto intimista, de voz pequena, entregue a uma emoção contida e, por isso mesmo, muito tocante. Em especial para a sensibilidade que começava a despontar naquela época, voltada contra os exageros, os derramamentos emocionais, as frases bombásticas.

Os estudiosos destacam duas fases em sua carreira de maturidade. A de estilo mais cool e outra em que a tonalidade emocional das notas, tanto no canto como no instrumento, passam a ser mais realçadas. No entanto, talvez ambas sejam apenas duas modalidades da mesma atitude diante da música. Chet buscava formas nunca óbvias. O “cool”, para ele, não era uma maneira de esfriar a música, mas de lhe aparar os penduricalhos, de modo que soasse em sua essência. O mesmo se pode dizer do canto e de sua interpretação das letras que vocalizava. Chet expressava de maneira suave a tempestade que habitava seu ser.

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As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.