Próximo de completar um ano na Espanha, o ator Tiago Barbosa tem motivos de sobra para comemorar. Afinal, no início do mês ele foi oficialmente consagrado como o principal intérprete do musical “O Rei Leão”, em cartaz em Madri. Uma vitória do talento e da persistência. “Quando cheguei, eu era um dos substitutos do personagem principal, o Simba”, conta o ator de 32 anos. “Conhecia muito bem o papel, mas o idioma era o entrave.”

continua após a publicidade

Barbosa, como muitos brasileiros, acreditava que falava mais ou menos bem o espanhol. Descobriu que não falava praticamente nada. “Para ser o Simba daqui, eu tinha que saber falar mais que o espanhol – precisava saber o madrilenho, conhecer todas as peculiaridades da língua falada aqui.” Foi o início, então, de um tortuoso processo que, para quem saiu do Brasil com todas as glórias pela montagem nacional de “O Rei Leão”, era inesperado.

continua após a publicidade

Afinal, desde que fez a audição para o papel no final de 2012, a vida de Tiago Barbosa mudou radicalmente. Garoto do subúrbio carioca, só fez o teste motivado por amigos, que pagaram sua passagem de ônibus. E, no dia da audição, arrancou lágrimas de Julie Taymor, a criadora do musical, que decretou ali o seu reinado como Simba. O vídeo de Julie abraçando emocionada o rapaz circulou entre todos os produtores estrangeiros que estavam interessados em levar a montagem para seu país, o que tornou Barbosa conhecido no meio artístico.

continua após a publicidade

Mas nada disso valia se, na Espanha, ele não conseguisse falar como um local. “Comecei como quarto substituto de Simba e, por mais que tentasse, não conseguia subir. Daí, percebi meu erro: eu falava em espanhol no teatro, mas em inglês nas ruas. Eu precisava me adaptar a esse povo, estar inserido na sociedade. E, também importante, tinha de engolir meu ego.”

Um tropeço linguístico em um ensaio bastou para Barbosa tomar uma decisão radical: não mais falava português ou inglês. Afastou-se das redes sociais, cortou ligação com família e amigos e imergiu no estudo diário. Apesar de o idioma ser o principal empecilho, havia também as adaptações na concepção do espetáculo.

Todas produções de “O Rei Leão” têm de seguir regras, para que a unidade do espetáculo original seja preservada. Adaptações à cultura local, no entanto, são bem vindas, para aproximar o espetáculo do público. No Brasil, por exemplo, o samba ditava o ritmo em algumas cenas. Na Espanha, Barbosa precisou se preocupar com outros detalhes. “Eu tinha uma brasilidade no gesto, na roupa. E, como era muito magro (pesava 60 kg), Julie achou que eu tinha cara de menino e meu Simba foi criado com esse perfil. Aqui, na Espanha, foi diferente. Os movimentos balineses foram dispensados e o Simba é mais adulto. Conversei com amigos que trabalharam no México e me disseram que lá também era diferente.”

Dessa forma, o Simba brincalhão que pisava nos palcos brasileiros cedia espaço para outro, um tanto mais sério. “A diretora na Espanha dizia para tirar muita coisa. ‘Quero menos’, ela dizia. Passei a desconhecer esse personagem. Tive de desconstruí-lo e criar um Simba Vidigal madrilenho, com novas entonações. Em alguns momentos, ele é até petulante e trata mal os amigos. A empatia do público com o personagem demora para nascer, em relação a como era no Brasil.”

Uma das maiores produções da Broadway, “O Rei Leão” segue uma cartilha extremamente profissional, a ponto de Barbosa ser dirigido por oito pessoas, cada um cuidando de um detalhe diferente. “Até de madrugada recebo mensagens sobre o que é preciso melhorar”, conta ele, que chega a fazer 10 sessões por semana. Tamanha devoção, porém, surtiu efeito. Hoje, o rosto de Tiago Barbosa está espalhado por Madri, anunciando o espetáculo. “Eu queria ser o número 1, não o 4. E consegui”, festeja ele, que chega na terça-feira, 17, ao Rio, para descansar e reencontrar os amigos do Nós do Morro, do Vidigal, com quem vai fazer uma apresentação. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.