Escalada, que completa 30 anos, é de uma época que os autores arriscavam mais

tv33.jpgLauro César Muniz se orgulha de pertencer à mesma geração de Dias Gomes, Bráulio Pedroso, entre outros. Juntos, eles ajudaram a dar uma "cara" à teledramaturgia nacional. Até então, as novelas brasileiras mais pareciam contos de fadas repletas de príncipes, rainhas e xeques. A primeira a romper com esse padrão anacrônico foi Beto Rockfeller, escrita por Bráulio em 1968. Mas Lauro também deu uma importante contribuição em 1975, quando escreveu Escalada, que completa 30 anos na quinta, dia 6.

Mais do que narrar a trajetória do caixeiro-viajante Antônio Dias, interpretado por Tarcísio Meira, a novela revisitava momentos marcantes da história do Brasil, como a construção de Brasília e o golpe de 64. "Essa novela se inseriu numa filosofia que consistia em fazer da telenovela uma redescoberta do Brasil", avalia Lauro César.

Dividida em três fases, Escalada foi a primeira novela do autor a revelar uma certa obsessão pelo tempo. Cada nova fase da história praticamente correspondia à produção de uma outra novela. Os cenários mudavam e os personagens também. Os atores que permaneceram ao longo de toda a trama passaram por um inédito processo de envelhecimento. Para o epílogo da novela, a Globo importou até um maquiador norte-americano, Victor Merinow, para caracterizar os atores. "Risco é a palavra-chave em teledramaturgia. Ninguém faz nada sem correr riscos. Na mesmice, nada acontece e o público assiste sempre à mesma novela", critica.

Sucessos e fracasso

A obstinação do autor pelo tempo voltou a ficar evidente em O Casarão, um ano depois. Nela, Lauro César narrou a saga de uma mesma família, através de cinco gerações, de 1900 a 1976. Mas, ao contrário do que aconteceu em Escalada, quando a narrativa obedecia a uma seqüência linear, a trama de O Casarão desenrolava-se em três tempos distintos, com as épocas intercaladas entre si. "Até o capítulo 10, ninguém entendeu nada. Hoje, nem minissérie fariam assim. Mas, naquele momento, o Boni estava disposto a buscar uma nova linguagem", elogia.

De fato, o então "todo-poderoso" da emissora devia sentir calafrios toda vez que Lauro entregava uma nova sinopse. Em Espelho Mágico, de 1977, por exemplo, o autor inseriu a produção de uma novela, a fictícia Coquetel de Amor, dentro da própria novela. O público, mais uma vez, não entendeu patavina. "Só não fui exilado da Globo porque Espelho Mágico me deu prestígio junto à crítica", suspira, aliviado. O mesmo não aconteceu com Os Gigantes, dois anos depois. A morbidez da história que incluía até uma cena de eutanásia logo no primeiro capítulo comprometeu a carreira do autor. "Este talvez tenha sido o meu maior fracasso. Um fracasso tão grande que fui até mandado embora", ri.

Questão de estética

Mas Lauro não ficou muito tempo longe da Globo. Depois de uma rápida passagem pela Band, onde escreveu Rosa Baiana, em 1981, ele voltou em 1983, quando foi escalado para concluir Sol de Verão. Mas, desde então, nunca mais repetiu o sucesso de Carinhoso e Escalada. Muito pelo contrário. O maior baque, garante ele, ainda estava por vir. O argumento original de O Salvador da Pátria previa que Sassá Mutema, o simpático bóia-fria interpretado por Lima Duarte, chegaria à Presidência da República. Mas, como 89 era um ano de eleições, tanto a direita quanto a esquerda chiaram. E chiaram muito. "Imediatamente, Brasília pediu que eu alterasse o rumo da história. Fiquei tão chateado que tive uma crise de vesícula e o Alcides Nogueira escreveu os últimos capítulos", relembra, contrariado.

Por essas e outras, Lauro César não sabe o que esperar do futuro. Ano passado, ele entregou quatro sinopses, todas de minisséries, para a Globo. "Quando você escreve novelas, doa um ano de sua vida para a tevê. Já não estou mais em idade para doar um ano de vida para ninguém", justifica. Mesmo assim, o autor, de 66 anos, andou sendo cortejado pela Record. Enquanto aguarda uma definição da Globo, não diz nem "sim" nem "não" à concorrência. "As pessoas têm o direito de escolher esteticamente os caminhos a seguir. O que posso dizer é que as pessoas que estão no comando da Globo hoje em dia não têm o mesmo ponto de vista estético que eu. Prefiro pensar que seja isso", tergiversa.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo