Há quem considere uma sexta-feira 13 como o dia em que o azar corre solto. Mas para a cantora Céu, a data foi a escolhida para o lançamento de seu 5º álbum de inéditas, “APKÁ!”. Com letras maiúsculas e exclamação, o disco chegou de surpresa nas plataformas digitais, com 11 faixas, um clipe para a música Coreto e o anúncio de uma turnê nacional. “Achamos que poderia ser legal e decidimos tentar. Foi muito interessante o retorno”, comenta a cantora sobre a estratégia até então inédita para ela, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
Sucessor do elogiado “Tropix” (2016), “APKÁ! foi composto durante a gestação de seu segundo filho, Antonino, fruto do relacionamento com o músico e colaborador Romário Menezes de Oliveira Jr., o Pupillo, que assina a produção do trabalho ao lado do francês Hervé Salters, da banda General Elektriks. O título, por sinal, vem de uma expressão cunhada pelo próprio caçula em “momentos de êxtase e plenitude” durante suas interações com a irmã mais velha, Rosa Morena, de 10 anos.
“Reparei que essa palavra vinha atrelada à sensação de alegria, de brincar. É uma coisa muito dele com a Rosa, com afeto e permeado pela energia de criança. No fim, foi a melhor palavra para simbolizar esse momento”, conta Céu. Em “APKÁ!”, ela continua sua saga de traduzir emoções em sonoridade, evoluindo através de elementos já familiares à sua discografia. “É um disco sobre contrastes, em geral. A gente vive um momento de polarização completa, de combate mesmo, e a necessidade desse contraste é crucial. A inteligência artificial está tomando força gigante nos nossos universos orgânicos. Eu falo muito desses digitalismos e das analogias às coisas reais.”
A dualidade entre real e imaginário, orgânico e virtual, permeia a maior parte das faixas de “APKÁ!”, mas aparece mais forte e explícita em momentos como Off (Sad Siri). A música, que abre o LP, narra a tristeza de uma robô ao perceber que, com o dia lindo lá fora, seu interlocutor decidiu abandoná-la para viver. “Talvez, daqui um tempo, nós tenhamos que realmente pagar para podermos ficar ‘off’, pontua Céu.
“Nada Irreal”, explica, vem na mesma pegada. “Você pode falar que é só uma música de amor, mas na verdade é sobre o real e não sobre ideologias amorosas, como se existisse um amor perfeito. Não, existe o amor real”, reforça, acrescentando que “APKÁ!” também é disco “sobre existir e ouvir” muito. “É o momento de entendermos como aconteceu essa grande m… na qual a gente está.”
Quanto a parcerias, o disco traz composição inédita de Caetano Veloso, em “Pardo”, presente que Céu comemora: “Eu não sei quais são os direitos das pessoas, mas, no meu caso, eu me dei ‘só’ a ousadia de pedir uma canção inédita, nada mais”, ri. “Ele, maravilhosamente, me respondeu que faria e me entregou essa canção, onde achou fantástico eu cantar sobre um relacionamento homoafetivo masculino, sendo mulher.”
A leveza dos vocais e da produção de “APKÁ!”, ainda mais dançante que seu antecessor, também tem seus momentos para discoteca, perceptível na parceria com a dupla André Laudz e Zé Gonzales, do Tropkillaz, “Eye Contact”. Já a colaboração com Dinho, do Boogarins, traz a primeira letra do compositor em inglês, com “Make Sure Your Head Is Above”. “Sempre transitei muito lá fora. Essa música foi um exercício e um momento de assumir esse universo que me pertence também. Já tive muitas propostas para fazer discos só em inglês, mas sempre tive muito apreço pela música brasileira e pelo português”, explica.
Pronta para cair na estrada com a turnê de “APKÁ!”, Céu promete novas datas para São Paulo (os dois shows na capital se esgotaram em menos de um dia) e insiste que prefere seguir seus instintos a estratégias minuciosas, como a maioria de suas contemporâneas: “toda vez que tento alguma coisa assim, vou me dar mal. Tenho um jeito muito orgânico de imprimir as energias que me passam em mente e no coração. Estou aprendendo, tentando fazer a minha parte dentro do meu micromundo. A grande revolução vem de dentro de cada um e depois para fora.”