Fora do tempo em que malucos beleza eram protegidos pelo manto das liberdades poéticas e alucinógenas, Raul Seixas seria um artefato explosivo a ser desativado. O Raul de hoje – ele completaria 74 anos no dia 28 – não se abrigaria mais nas metáforas nem nos delírios coletivos. Suas palavras cortariam cabeças e a idolatria messiânica à sua figura, acrescida em 30 anos de fileiras militantes, se tornaria uma questão de segurança de Estado.
Se governos por vezes se assustam com discursos recondicionados dos combates verbais dos anos 1970 para falar das causas atuais, Raul seria a palavra viva atravessando a carne todos os dias. Imagine estudantes nas ruas entoando “Viva! Viva!, Viva a sociedade alternativa!”. Não haveria maturidade para lidar com a ideia do que seria identificado como a apologia para a criação de uma nação independente. Não era nada do que dizia, mas era o que seria escutado na era em que o primeiro ato já não se sobrepõe ao segundo.
Mas Raul tinha poderes também quando falava de sonhos e, ao menos por um momento, parece colidir com rei Arthur do musical. O roqueiro dizia: “Eu devia estar contente porque eu tenho um emprego / Sou o dito cidadão respeitável / E ganho quatro mil cruzeiros por mês”. Devia, mas não está. E o rei diz: “Só um tolo deseja aquilo que não pode ter”. Foi desejando o que não poderia ter que Raul teve mais do que um dia imaginou.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.