A nova produção de Carmen, de Bizet, que subiu ao palco do Festival Amazonas de Ópera tinha uma razão principal de ser: a presença da soprano Cristina Gallardo-Domás no papel principal. A cantora chilena é estrela do cenário internacional e escolheu Manaus para estrear no papel. Natural, portanto, que todos os olhos e ouvidos estivessem voltados para ela em uma noite que, no entanto, revelou outras possibilidades vocais.
A Carmen de Gallardo-Domâs, em termos vocais, é um papel ainda em gestação, por conta das dificuldades que a soprano tem com a tessitura de um papel escrito para um tipo de voz mais grave do que a sua e com a qual ela ainda não está completamente à vontade. Mas a soprano é muito musical, demonstra especial atenção ao texto e, cenicamente, consegue criar uma Carmen feroz e sensual.
Ao seu lado, como o soldado Don José, uma boa surpresa: o jovem tenor basco Andeka Gorrotxategui, no início de uma carreira que, no ano que vem, o trará de volta a Manaus como Manrico, em Il Trovatore. Ele é dono de um timbre bonito, escuro e de agudos fáceis. Os dotes vocais, no entanto, esbarram em uma presença cênica inexpressiva. O barítono Homero Velho, por sua vez, demonstrou a eficiência vocal e cênica de sempre como Escamillo e a soprano americana Joanna Parisi revelou-se uma Micaela matizada, mistura de jovem inocente e mulher capaz de vencer seus medos para defender o homem que ama. Destaque também para Murilo Neves (Zuniga), Alfonso Mujica (Morales, Dancairo) e Andreia Souza (Mercedes).
A montagem de Enrico Castiglione tem corte tradicional, evocando Sevilha, mas optando por ambientes cênicos que sugerem um clima intimista para a ação. O efeito, no entanto, torna-se monótono ao longo da ópera. E, se houve grandes momentos de teatro na récita da noite de sábado, eles se deveram à atuação cênica de Gallardo-Domâs e, principalmente, à regência do maestro Luiz Fernando Malheiro, à frente da Amazonas Filarmônica.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.