Em Let it Bed, Arnaldo demonstra os Mutantes

Dizem que ele é louco por ser assim. Ele responde dizendo que se eles são famosos, ele é Napoleão. Mentira, claro, apenas para confundi-los – o império de Arnaldo Baptista é outro. 22 anos depois de um acidente que o levou ao coma e quase o matou, o mutante, autor da clássica Balada do Louco (parceria com Rita Lee), está de volta, lançando o CD Let it Bed.

Nas treze faixas do álbum, que vem encartado na última edição da revista “outracoisa”, o músico reafirma, como na canção, que é melhor não ser o normal. Difícil duvidar. Se Rita Lee seguiu um caminho que a levou com honras ao título de rainha do rock brasileiro e Sérgio Dias foi para outro lado, amadurecendo seu virtuosismo, Arnaldo mostra que continua na trilha de eterno Mutante.

O compositor tem autoridade para carregar o legado dos Mutantes. Rogério Duprat, o maestro do tropicalismo, já declarou que Arnaldo foi o cabeça da banda, na sua opinião o melhor que surgiu do movimento que revelou também Caetano e Gil. Normal, então, a expectativa de fãs, ilustres como Sean Lennon (o músico fez questão de tocar com o mutante em seu show no Free Jazz Festival, há quatro anos) ou anônimos, com a volta de Arnaldo aos discos. Let it Bed não os decepcionou.

“O CD é coerente com a carreira de Arnaldo. Tem a temática da loucura, que ele usa desde sempre, seu humor, os trocadilhos, sua investigação científica, com versos sobre criogenia e energia solar”, explica o John Ulhoa, guitarrista do Pato Fu e produtor do CD.

John é um dos principais responsáveis pela existência de “Let it bed”. Ao lado do amigo Rubinho Troll, ele apresentou Arnaldo a modernos recursos de tecnologia, como programas que simulam toda a estrutura de um estúdio profissional, e criou uma estrutura que permitiu a gravação, espalhando microfones pela casa do compositor, para registrar todos seus arroubos criativos – Arnaldo não se adequaria ao esquema rígido de um estúdio.

O disco tem a emoção “latina” da fita cassete (Cacilda) e a eletrônica (explícita em canções como LSD). Sua relação ambígua com a tecnologia é expressa em Tacape, faixa que encerra o disco (“E até nos helicópteros/ Há essa vontade de voltar/ pro tacape imenso”).

Let it Bed não é apenas sobre tecnologia X humanidade. Passa por folclore, Pica-Pau, clonagem de Cristo, energia solar, motocicletas, vida depois da morte, amor. A jornada começa já pelo título, criado há muitos anos, que faz uma brincadeira com “Let it be”, dos Beatles, e “Let it bleed”, dos Rolling Stones.

“Bed é cama, que lembra o coma no qual fiquei mergulhado. E toda noite, dividimos nossa cama com nosso pensar”, filosofa. “Antes de dormir, costumo fazer uma resenha do que fiz no dia, penso nas conseqüências dos meus atos, do que falei. O disco fala de quando estamos deitados com um travesseiro, uma menina, um deus, uma deusa”, acrescenta Arnaldo.

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