Pensar o envelhecer remete à finitude, e a finitude, às vezes, assusta. Na dança, certa ideia de juventude e habilidade toma conta do imaginário comum. Encontrar com um corpo “velho” em cena pode produzir estranhamento. E é este o convite que o coreógrafo sueco Mats Ek propõe nas duas coreografias, Memory (2004) e Axe (2015), e na exibição do videodança Old and Door (1991), programa inédito no Brasil, que será apresentado na 15ª Temporada de Dança do Teatro Alfa, nestes sábado, 20, e domingo, 21.

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Aos 72 anos, Mats Ek se mantém como uma das referências da dança mundial. A sua atuação como diretor do Cullberg Ballet, de 1985 a 1993, foi o marco de visibilidade de sua carreira. Desde então, assinou uma série de coreografias para companhias, como a Ópera de Paris e a Nederlands Dans Theater.

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Identificado na linhagem coreográfica de Kurt Joss, Mats Ek conta lançar mão de recursos teatrais e de movimento para trazer ao palco a complexidade das relações humanas. Em Memory, o artista está em cena ao lado de sua parceira de trabalho e vida, a bailarina espanhola Ana Laguna, de 62 anos, em uma discussão sobre a passagem do tempo, a plenitude e o envelhecimento. Apesar do trabalho ser de 2004, a versão que será apresentada em São Paulo é recente: “Nós ficamos sem dançar (‘Memory’) por 14 anos! Nós fizemos, vamos dizer, 50 performances dessa peça. A versão, aqui em São Paulo, é a final, que foi feita para um festival há dois meses. Então, a coreografia é velha e jovem ao mesmo tempo”, conta Mats Ek.

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Já Axe, duo coreografado para Ana Laguna e Yvan Auzely (59), que, assim como Laguna, também foi bailarino do Cullberg Ballet, parte de uma situação de trabalho do campo, um corte de lenha, e se desenvolve em relações de atrito e confronto entre os corpos, que leem a ação de lenhar a partir de dois diferentes pontos de vista: uma prática corriqueira e um ato de violência. “Acho que tem uma conexão entre os dois ‘pas de deux’ que serão apresentados. Além de Ana Laguna estar nas duas peças, existe uma discussão sobre memória e envelhecimento, apresentada a partir dos sentimentos daqueles indivíduos que participam da performance”.

O vídeodança Old and Door acentua mais uma vez o tempo e a memória, a partir do registro da coreografia que Mats Ek criou para sua mãe, Birgit Cullberg, bailarina sueca referência na dança moderna que, à época, estava no auge de seus 83 anos. “Não considero que a dança esteja conectada apenas à juventude. Eu a conecto com a juventude, a meia idade e a idade avançada. Depende do objeto, do tipo de material que tem para a coreografia em si”, explica o coreógrafo, ao que complementa: “A contribuição só pode acontecer se nós tivermos o material que um corpo velho pode lidar. Qualquer outra coisa é bobagem”.

Em 2015, Mats Ek anunciou que se afastaria dos palcos, causando um rebuliço no universo da dança; no entanto, a decisão parece ter sido momentaneamente adiada: “Minha vida após os palcos é um pouco difícil de prever, mas agora estou de volta tentando coreografar mais uma vez. No meio do ano, apresento um programa na Ópera de Paris”, revela.

A relação com a dança, segundo o artista, se mantém no registro da entrega e da integridade que acompanha sua carreira desde o início. Mats Ek promete trazer aos palcos do Alfa um deslocamento no senso comum sobre corpo que dança a partir da maturidade. Como conta a filósofa Simone de Beauvoir, em seu livro A Velhice (1970), só é possível viver a velhice sem tratá-la como uma paródia absurda do passado, na medida em que seguimos nas ocupações que dão sentido à existência; sentido que parece ser o compromisso que o coreógrafo sueco busca manter na vida através da dança.

MEMORY, AXE E OLD AND DOOR

Teatro Alfa. R. Bento Branco de Andrade Filho, 722.

Sáb. (20), 20h; dom. (21), 18h.

Ingresso: R$ 75

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.