“Não seja um Trump”, disse, ao microfone, uma funcionária da produção de Eddie Vedder, em alusão ao presidente norte-americano. O pedido era claro: celulares estavam proibidos no show do vocalista do Pearl Jam. Quem puxou o aparelho, levou bronca da equipe de Vedder e do Citibank Hall. Vedder fez um convite ao seu íntimo e, por isso, queria que o momento fosse guardado ali, gravado na memória, não nessas pequenas máquinas de bolso sacadas a qualquer momento em apresentações normais.

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Diferentemente da grandiosidade inerente a uma apresentação do Pearl Jam, no qual a força das canções equivalem à voz poderosa do seu cantor, na apresentação solo, Vedder pode ser quem quiser. Abre-se às emoções tão próprias, no fundo tão íntimas, que estabelece um outro tipo de relação com o público, cerca de 4,1 mil pessoas, responsáveis por esgotarem os ingressos nessa primeira de três noites. Embora seja o mesmo, Vedder, quando está só, surge sem o personagem roqueiro. Deixa-se aparecer, tímido nos primeiros minutos. Surge no palco mais curvado do que o normal, dirige-se ao órgão posicionado de uma forma com a qual ele canta a primeira música de costas para o público.

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Dentro do seu hábitat, Vedder mostra mais quem é na intimidade. Desorganizado, perde-se entre os instrumentos que lhe rodeiam (violões, bandolim, banjo, ukelelê), embanana-se entre os papéis com as frases a serem lidas em português. É um caos pelo qual, entre um gole e outro de vinho, ele encontra seu caminho.

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Quando, de fato, se dirige ao público, Vedder promete um show sobre ausência. “Boa noite”, ele fala, “as músicas que vou mostrar aqui são sobre perder… E não estou me referindo ao futebol. Desde a última vez que estive aqui (em 2014), perdi muitos amigos. Meu herói (Tom Petty) e meu irmão (Chris Cornell). Espero que vocês não tenham passado por algo assim, mas, se tiverem, vamos cantar para eles”.

Ao convidar o público para o seu universo, Vedder se mostra como anfitrião, distribui vinho para a plateia e exibe uma seleção de canções que lhe tocam, costuradas pelo sentimento de perda. Toca seus discos solos de forma moderada. São três canções de Into the Wild e uma de Ukelele Songs. Dá ênfase ao material do Pearl Jam, mas é com os covers que oferece o retrato de si.

Walking the Cow, de Daniel Johnston, e Brain Damage, do Pink Floyd, ele canta sobre os fantasmas que existem dentro de cada um. Nada, no show, é mais forte do que as primeiras notas de Hurt, de Trent Reznor, do Nine Inch Nails, composta quando a dependência química dele criava um labirinto interminável dentro da sua cabeça. A canção, posteriormente, ganhou uma versão tocante de Johnny Cash, já ao fim da vida. Cash a gravou em 2002, viu sua amada June Carter morrer em maio do ano seguinte e se foi em setembro, meses depois.

Ao nos deixar adentrar novamente o seu mundo, Vedder evidencia que os anos foram sombrios. Embora seja brincalhão com o público, como em 2014, a cabeça dele agora gravita por temas mais densos. É tudo tão íntimo que se torna compreensível o pedido para que as fotos e vídeos fossem evitados. Caso contrário, seria algo assim: “Nossa, estou sofrendo”, diz um, “pera, deixa eu tirar uma foto dessa sua lágrima”, responde o outro.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.