Alan Berliner já perdeu a conta das pessoas que sopram no seu ouvido para dizer que “Minha Vida em Cor de Rosa” é o filme da vida delas. Ele próprio gosta muito do filme do belga Alain Berliner. Um simples I – Alan/Alain – diferencia os dois. Alan Berliner é um cineasta norte-americano. Um documentarista, embora não se defina como tal. “Sou filmaker, cineasta”, diz. Seus filmes têm passado com frequência no É Tudo Verdade, mas esta é a primeira vez que ele visita o País. Chegou domingo. Andou um pouco, comeu comida japonesa, temaki. Fica até domingo, nesta terça participa da abertura das conferências que correm paralelamente à exibição dos filmes. Pela manhã, no Museu da Imagem e do Som (MIS), Alan Berliner fala de cinema (documentário) e vanguarda.
É um tema ao qual seu nome é sempre associado. Vanguarda, experimentalismo. Os documentários são pessoais e colocam (sempre) a linguagem em evidência. Ele mostra o novo trabalho, “Primo em Segundo Grau”. À reportagem, o criador do É Tudo Verdade, Amir Labaki, disse que colocou “Primo” numa seleção especial porque seria covardia lançar o filme na competição – o filme ganhou talvez os principais prêmios de documentário do ano. É um dos trabalhos mais premiados de Alan Berliner. “Não chegamos a conversar sobre isso, mas teria dito a Amir que não queria competir. E não é porque ache que sou imbatível. A verdade é que não preciso mais de resumé (currículo)”, explica, durante entrevista realizada nesta segunda, num café da Avenida Paulista.
“Primo em Segundo Grau” trata de identidade, família, memória, temas que percorrem a identificam a obra autoral de Alan Berliner. Ele já fez filmes (retratos) de seu avô e de seu pai, tentando descobrir quem é. Foi atrás de homônimos como ele, ao descobrir que seu nome – mesmo sem o I de Alain – não é raro na ‘América’. Nascido e criado no melting pot de Nova York, Alan reconhece a importância da questão da identidade. “Pelo lado paterno, descendo de russos e poloneses. Pelo materno, de egípcios e palestinos. O acaso quis que meus pais se conhecessem e casassem em Nova York, mas são produtos de culturas muito diferentes e vastas. Sempre tive curiosidade de saber quem sou e de como essas influências se somam em mim”, explica.
O novo filme demorou o tempo médio das realizações de Alan Berliner – cinco anos. “Em geral, preciso de um tempo, em torno de um ano, para promover os filmes e para me esquecer como é difícil realizá-los. Preciso dessa fase de distanciamento antes de começar tudo de novo.” “Primo em Terceiro Grau”, como diz o título, é sobre o poeta Edwin Honig, primo em terceiro grau de Alan Berliner. Ele sofre de Alzheimer, e Alan investiga como a doença o afeta. “Meu primo foi e ainda é muito importante na minha vida, uma influência decisiva, embora seja 36 anos mais velho. Ele sempre foi brilhante com as palavras, sempre teve a memória prodigiosa e agora a memória falha, lhe faltam as palavras. Mesmo assim, ele ainda se comunica por metáforas, como sempre fez. A música da palavra é essencial em sua vida.”
A doença desempenha seu papel na vida do primo e, consequentemente, no filme, mas “Primo em Terceiro Grau” não é sobre Alzheimer – ao contrário de “Não me Esqueça”, do alemão David Sieverking, que filma a própria mãe, eternizando sua imagem e tentando retardar ao máximo o impacto do Alzheimer que a empurra para o esquecimento. “Não me Esqueça” integra a competição internacional. Até por seus temas – e método -, Alan Berliner não poderia ser associado ao documentário político (e militante). Ele sabe disso – “Tenho respeito e admiração pelas pessoas que, como Don Quixote, elegem suas causas, mas eu tenho os meus moinhos de vento pelos quais lutar”, explica. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.