O reconhecimento do talento de Dona Inah, que divide o palco do Sesc Pinheiros nesta sexta-feira, 14, com a cantora Alaíde Costa em show inédito, sempre vem acompanhado de uma boa dose de espera. Depois de conquistar o Prêmio Tim de 2005 na categoria revelação aos 69 anos, a “Dama do Samba” de São Paulo dá continuidade à sua carreira com uma movimentada agenda de apresentações, mas ainda espera há anos pelo lançamento de dois projetos envolvendo seu nome.

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O primeiro deles é um disco feito em Cuba com canções latinas, em que a cantora dá provas de que seu vasto repertório vai muito além do samba. Gravado em 2010, com músicos cubanos, entre eles o pianista Pepe Cisneros, o álbum ainda segue no forno à espera de apoio financeiro para ser lançado, já que envolve questões como a liberação de direitos autorais de algumas canções gravadas.

De lá para cá, Dona Inah lançou em 2013 o elogiado e terceiro disco de sua carreira, Fonte de Emoção, acompanhada pelo grupo Cadeira de Balanço, com quem ela se apresenta há anos às quartas-feiras no bar Ó do Borogodó, frequentemente lotando a pequena casa que fica na Vila Madalena. No álbum, que tem arranjos do violonista e compositor Zé Barbeiro, foram registradas músicas inéditas de Monarco e Délcio Carvalho, além de uma composição de Dona Inah.

O segundo projeto que envolve o nome da sambista e que ainda aguarda para ser lançado é ainda mais vultoso do que o primeiro. Trata-se do documentário Que Cantadora a Vida me Fez. Dirigido pela cineasta Patrícia Francisco, o projeto surgiu em 2009 e já foi contemplado por dois editais (Natura Musical e ProAC ICMS, do governo de São Paulo), mas ainda aguarda a captação de mais recursos para ser finalizado. A previsão de lançamento é para agosto deste ano.

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“No começo, a ideia era fazer um documentário mais tradicional, o primeiro roteiro era assim. Aos poucos, fui mudando e decidi fazer uma cinebiografia”, comenta a diretora. O filme, que vai mesclar ficção e realidade para retratar a carreira da sambista, contará com a atriz Érica Ribeiro, que interpretará Dona Inah jovem, por exemplo, em cena cantando Luzes da Ribalta, que marcou a estreia da cantora num programa de calouros vencido por ela.

“Eu tinha saído de Araras, a minha cidade, já estava em Santo André, e participei do concurso Peneira Rodini, com mais de mil pessoas na plateia. Não queriam me deixar cantar porque eu não tinha ensaiado com os músicos. Acabou que cantei, o lugar veio abaixo”, lembra Dona Inah. “Foi meu primeiro cachê, fui correndo para casa com medo de que alguém me roubasse. Cheguei em casa, entreguei todo o dinheiro pro meu pai e disse: pai, pega o dinheiro, vai no mercado e compra o que precisa, agora eu vou ganhar dinheiro para não deixar faltar mais nada em casa”, completa a cantora.

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Antes, em Araras, no interior de São Paulo, Dona Inah cantava no clube da cidade e já despertava atenções. Segundo ela, grandes estrelas passavam por lá e queriam levá-la para o Rio de Janeiro. Foi assim com Luiz Gonzaga e Orlando Silva, mas o pai da jovem cantora não liberava. “Ainda em Araras, meu pai, que era músico e tocava trompete nas trilhas do cinema mudo, me levou para ter aula de música com um professor. Ele me dispensou dizendo para o meu pai que não podia dar aula para uma negra, porque ia fazer com que ele perdesse os outros alunos”, diz a sambista.

Anos depois, as dificuldades persistiam, mas Inah ia se virando do jeito que dava. “Fui fazer um teste para cantar com uma orquestra. O sujeito que regia a orquestra não sabia nada de música e disse que eu tinha cara de lavadeira, de cozinheira, não de cantora. Sem desmerecer essas profissões, mas eu comecei a chorar, queria cantar”, lembra também Dona Inah.

No longo período entre as primeiras apresentações em programas de calouros (e de rádio) e o reconhecimento tardio com prêmios após seu primeiro disco (Divino Samba Meu, de 2004), Dona Inah trabalhou em casas de família durante muitos anos e conseguiu se aposentar com um cargo na prefeitura de São Caetano.

O documentário de Patrícia Francisco vai mostrar toda essa trajetória, com cenas mais recentes de Dona Inah se apresentando no Ó do Borogodó, mas também relembrando o passado da artista. Neste sentido, por exemplo, foram feitas imagens em uma antiga senzala no interior de São Paulo, para contar que Inah é neta de escravos.

Assim como ocorreu com grandes nomes do samba, como Cartola, Nelson Cavaquinho e Clementina de Jesus, Dona Inah teve seu reconhecimento de forma tardia, mas não reclama. “Ganhar esses prêmios, fazer meus shows, gravar os discos e agora ver esse documentário são um reconhecimento, é muito gostoso”, acrescenta a Dama do Samba.

No show com Alaíde Costa, cada uma delas vai mostrar canções de seus repertórios, que incluem nomes como Milton Nascimento, Paulinho da Viola, Monarco, Eduardo Gudin, Paulo César Pinheiro, Chico Buarque, Cartola, entre outros. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.