Documentário sobre Jobim está em andamento

Tom Jobim foi um apaixonado pelo cinema, fez muitas trilhas sonoras, era amigo de cineastas com quem inventava cenas e roteiros nunca realizados. O filme definitivo sobre ele será feito este ano, 2005, por Nelson Pereira dos Santos, que se juntou à cantora Miúcha, ao também diretor Marco Altberg e ao filho de Tom, Paulo Jobim. As filmagens começam no segundo semestre, mas a sinopse já está pronta. "Serão dois longas, a exemplo do que fizemos com Sérgio Buarque de Holanda, um com parentes e amigos contando quem ele era e outro sobre sua obra, enfocando três temas recorrentes: o Rio, a natureza e o amor. Ia ser a mulher, mas falar de amor fica melhor??, adianta Nelson. "Como todo documentário, o roteiro é aberto, cabe nele o que Deus quiser e o Tom soprar.??

Ao contrário de Sérgio Buarque, cuja obra exclusivamente literária e voltada para o Brasil exigiu imagens extras a ela para ser mostrada, Tom Jobim tem farto material em cinema e vídeo, de shows, clipes e especiais para televisão, no Brasil e lá fora, e desde os anos 60, quando a bossa nova se tornou sucesso mundial.

Nelson e Tom se conheciam havia décadas, mas só se cruzaram profissionalmente nos anos 80, na série para a Rede Manchete A Música Segundo Tom Jobim, perdida com a extinção da emissora. Antes, nos anos 70, quando o compositor, Miúcha, Vinícius de Moraes e Toquinho lotavam o Canecão, Nelson começou a escrever o roteiro de um musical de ficção que nunca saiu das primeiras páginas, apesar de ele ter filmado cenas de palco e de bastidores. "O filme não saiu porque o Aloísio de Oliveira explicou ao Nelson que nunca conseguiria ter músicos acordados antes das 8 da manhã, como é necessário no cinema", conta Miúcha. Além de trabalhar na sinopse, com Nelson, ela será uma das entrevistadas, pela larga convivência que teve com o maestro. "Eu vou contar as histórias de bar."

O primeiro filme terá como base o livro Tom Jobim, Um Homem Iluminado, escrito por Helena Jobim, única irmã dele, biografia carinhosa lançada em 1995, ainda sob o impacto de sua morte, um ano antes. A idéia é abrir com Helena contando a infância e a adolescência do compositor, já que eles foram ligadíssimos. "Foi difícil e, ao mesmo tempo, uma catarse escrever esse livro. Cheguei a jogar fora todo o trabalho de seis meses, pois não queria ser piegas nem exagerar na dramaticidade, mas o filme será mais fácil porque o contato inicial com o Nelson foi muito bom", diz Helena. "Fico feliz porque será mais uma oportunidade de falar sobre o Tom e vai divulgar mais o livro. Foi minha única obra biográfica, entre os 14 livros que escrevi, pois me sinto uma romancista, acima de tudo."

Foi por meio de um romance de Helena, Trilogia do Assombro, que Marco Altberg conheceu Tom. Em 1987, ele adaptou o romance para o cinema, com o título de Fonte da Saudade, e chamou o maestro para escrever a trilha sonora. "Ganhou prêmio no Festival de Gramado e, desde então, o Tom sempre vinha com idéias sobre filmes. Sugeriu até um clipe do Samba do Avião, filmado do ponto de vista do urubu. Ele dizia que sua música reportava a imagens e que se baseava nelas para compor", conta Altberg, que antes havia tido rápidos contatos com o compositor. "Ele fez a música de Guerra Conjugal, de Joaquim Pedro de Andrade, do qual fui assistente de direção, mas só fui reencontrá-lo depois, nos anos 80. Nelson é o diretor ideal este filme porque ele e Tom são parecidos, um corresponde ao outro em suas profissões."

Às vésperas do Natal, Paulo, Nelson, Miúcha, Marco e Márcia (filha de Nelson Pereira e sua assistente) se reuniram para levantar as imagens em movimento de Tom e listar os possíveis entrevistados. Além de Helena, devem falar Tereza Hermany (a primeira mulher e mãe de seus dois filhos mais velhos) e Ana Lontra Jobim (sua viúva, mãe de Maria Luíza, a caçula), os filhos, os quatro netos e os músicos influenciados e/ou apadrinhados por ele. É uma lista infindável, pois inclui praticamente todos os músicos brasileiros dos últimos 50 anos e muitos do exterior.

Acervos de Tom e Lúcio serão reunidos

Arquiteto e urbanista Lúcio Costa e o músico Tom Jobim foram amigos de longa data, além de terem carreiras paralelas e importância fundamental na modernização do País, cada um no seu estilo. Por isso, nada mais natural que os acervos deixados pelos dois fiquem juntos no Jardim Botânico, à disposição de outros profissionais de suas áreas que queiram pesquisar o conhecimento que eles adquiriram e dos leigos que admiram a obra de ambos. Essa é a idéia do filho de Tom, Paulo Jobim, e da neta de Lúcio, Julieta Sobral, que estão trabalhando na organização, digitalização e divulgação de seus acervos.

Eles já têm o lugar onde o material ficará: um galpão no Jardim Botânico, que será transformado no Centro de Preservação da Memória, com projeto de Paulo Jobim, que é músico e arquiteto. Já têm também o dinheiro necessário para cuidar dos papéis (músicas, partituras, projetos, textos, desenhos, etc.) deixados pelos dois. O acervo de Lúcio Costa recebeu R$ 240 mil da Petrobras e o de Tom Jobim, R$ 261 mil, também da estatal, sempre pela Lei Rouanet. "Só faz sentido investir nesses acervos para deixá-los ao alcance do maior número possível de pessoas". A organização do acervo de Tom está mais adiantada porque o maestro, no fim dos anos 80, chamou a museóloga Vera Alencar, hoje diretora dos Museus Castro Maya, para iniciar o trabalho completado por Eliane Vasconcelos, da Casa de Rui Barbosa. O material em papel já está, em parte, digitalizado e pronto para entrar na página do Instituto Tom Jobim na internet, ainda em criação, embora Paulo ainda não esteja satisfeito com o programa. "Está muito careta. As informações foram fichadas, mas é preciso arrumar um modo lúdico de encontrá-las e isso ainda está em estudos", explica ele. "A parte sonora e de fotografia, que é muito grande, também precisa ser trabalhada. Hoje há, na internet, o clubedotom, página criada por Luiz Roberto Oliveira, que é bem completo, mas logo haverá o oficial."

O acervo de Lúcio Costa requer mais trabalho. Ficou no prédio em que ele morava e tinha escritório, no fim do Leblon, e só foi mexido em 2002, quando o Paço Imperial fez a exposição do centenário de seu nascimento. E ele guardou tudo o que produziu desde os 12 anos. "Meu avô era humilde no sentido nobre do termo mas não tinha falsa modéstia. Desde criança se programou para ser uma pessoa importante para o País", conta Julieta. "Só que sua organização era muito particular e o material está guardado em caixas, em verdadeiras camadas geológicas, que precisam ser identificadas de acordo com a época em que foi produzido".

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