Diferença social e tragédia humana marcam Match point

d81.jpgConhecido por produzir filmes tragicômicos, habitados por personagens neuróticos, finalmente Woody Allen volta a fazer uma bela obra. Após Melinda e Melinda (2005), que não agradou nem a seus fãs de carteirinha, o cineasta consegue em um novo cenário – primeira produção das três que rodará em Londres -criar uma história envolvente; e o que é melhor, com um final que choca e surpreende. Em Ponto final -Match point, com estréia marcada para a próxima sexta-feira, dia 17, o público observa um protagonista descontente com sua vida simples e, que ao entrar para uma família abastada, revela seu lado mais sombrio.

Tudo ocorre de forma natural, mesmo quando Chris Wilton (um professor de tênis angustiado com sua profissão) vive cenas mórbidas, Allen evidencia o clima humano tomando suas atitudes como sensatas. Para o papel de Wilton, o cineasta escolheu a estrela britânica Jonathan Rhys Meyers que, em excelente fase, caracterizou o protagonista tal como Allen escreveu no roteiro. Todo o argumento do filme tem forte influência de Crime e castigo, obra do autor russo Dostoiesvsky, além da visão do cineasta Bergman. Ou seja, existe um crime e um castigo que se relacionam com confissão e indulgência.

A real diferença entre a vida em classes sociais distintas, foi o mote escolhido para sustentar o argumento do filme. Chris Wilton, um jovem professor de tênis que se tornou alguém reconhecido graças ao próprio esforço, recém chega a Londres e  contratado para dar aulas em um clube freqüentado pela aristocracia londrina. Repentinamente faz amizade com Tom Hewett (Matthew Goode), um executivo rico que o apresenta a sua família abonada. A bela jovem Chloe Hewett (Emily Mortimer) irmã de Tom, se apaixona por Chis, que ainda encanta toda a família Hewett.

Tudo ficaria simples demais para Chris se em seu caminho não aparecesse a bela Scarlettt Johansson, que dá vida a Nola Rice, namorada de Tom. Ela se torna sua tentação, a musa que inspira sua verdadeira paixão, apesar de representar uma aventura. Visivelmente abalado, principalmente quando Nola está por perto, Chris tem sua angústia (em ser importante e realizar algo que chame a atenção) evidenciada. Nola é uma americana aspirante a atriz, que vive sob os olhos discriminantes da mãe de Tom, Eleanor Hewett (Penelope Wilton). O filme inicia e chega a seu desfecho com uma trilha sonora impecável. A escolha por óperas de Verdi, que também faz o gosto dos personagens de Match point, passa por Un dì felice, eterea, de "La Traviata"; Gualtier Malde!àCaro nome, de "Rigoletto"; O figli, o figli miei!, de "Macbeth"; Desdemona, de "Otello", entre outras tragédias.

Como de costume nos filmes de Woody Allen, inúmeras referências artísticas povoam os diálogos de seus personagens; em uma delas, o autor faz menção ao escritor grego Sófocles, que em suas tragédias mostrava o sofrimento como um sentimento proveniente de uma paixão incontrolada e como conseqüência acidental. Em outra, os personagens vão ao cinema assistir O diário de motocicletas, de Walter Salles. A personagem Chloe comenta com seu irmão que somente Nola poderia ter escolhido tal filme – pouco atraente para uma aristocracia inglesa. Todos esses ingredientes servem como receita para que Match point formate um drama intenso, e desta vez, com um destino concreto.

No começo do drama o diretor cita um pensamento, retomando-o no final, que deixa claro aonde quer chegar. "As pessoas temem admitir que uma imensa parte da vida depende da sorte. É assustador pensar que há tanto fora de nosso controle. Num jogo, há momentos em que a bola bate no alto da rede e, por uma fração de segundo, ela tanto pode seguir à frente, ou cair de volta. Com um pouquinho de sorte, ela vai em frente e você ganha. Ou talvez não, e você perde".

A forma como os acontecimentos se dão, tornam a vida do protagonista cada vez mais difícil. Seus pecados estão por um fio para se tornarem públicos. Sua ambição em se manter no meio aristocrático irá definir seu destino, além de sua sorte. Tal como em Crime e castigo, onde um jovem sem dinheiro comete um assassinato devido à angústia em ser alguém importante, em Match point, Chris também mata. Por meio de seus personagens, Allen ainda brinca com a história do livro trazendo alterações temporais para o filme. O drama paira no ar. Allen parece ter abandonado a comédia e optado pela tragédia, que aos olhos de quem assiste ao filme, parece o estado natural do sentimento humano.

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