Anna Muylaert, Regina Casé e Camila Márdila. Três mulheres protagonizam o sucesso do filme Que Horas Ela Volta?, premiado em Sundance, no Festival de Berlim e cotado para representar o País no Os car. Apesar disso, o destaque feminino não foi respeitado no debate promovido no sábado, 29, pela Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), no Cinema do Museu, no Recife. Presentes a convite da própria diretora, os cineastas pernambucanos Cláudio Assis e Lírio Ferreira tumultuaram o debate ao interromperem insistentemente as falas da diretora, dos organizadores e questões da plateia. “Com esse filme, venho sentindo que caí numa zona masculina. Tenho sentido os homens tentando me ofuscar em várias situações, como se o brilho feminino fosse algo perigoso”, incomoda-se a diretora Anna Muylaert.
O cinema da Fundaj, “casa” da produção pernambucana contemporânea, divulgou em nota nesta segunda, 31, uma decisão inédita na história da instituição: punir os diretores com um embargo a qualquer evento relacionado a seus filmes ou que conte com a presença dos dois. A punição tem validade de um ano. “É uma decisão duríssima. Não foi personalizada, não fui eu nem o Kleber. Foi uma determinação da instituição, que há mais de 60 anos se dedica à pesquisa e trabalha para tornar a sociedade brasileira mais igualitária”, comenta Luiz Joaquim, que divide a curadoria do cinema com o diretor Kleber Mendonça e participou do debate como mediador. “A decisão foi no sentido de se colocar para a sociedade. Foi a forma mais direta de dizer que a Fundação não vai aceitar a intolerância.”
Em relação à represália, Anna diz ter dois sentimentos: “como pessoa, acho humilhante para os meus amigos, mas como cidadã acho importante”. Disse ainda que a medida serve para esclarecer onde começa o machismo. “Não é o caso de demonizar. A discussão muito maior.”
Anna, que tem viajado muito na divulgação do filme, descreve situações similares fora do Brasil. “É uma questão nacional e mundial. Em Hollywood, as mulheres também estão falando. Não dá mais, as mulheres vão brilhar sim, não vão ficar em casa. E os homens têm que aprender a ficar na sombra, a ouvir, não só a falar”, diz a diretora. “No início do cinema, quase só tinha mulher. Quando começou a dar dinheiro, foram expulsas. O mundo do dinheiro é masculino. Quando meu filme vendeu e cresceu, pequenas coisas passaram a me fazer sentir que sou intrusa. É como se ninguém soubesse muito bem como lidar comigo agora.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.