Transposição do longa de Ingmar Bergman, a peça Sonata de Outono, que integrou a grade do Festival de Curitiba, torna evidente quão essencialmente teatral era o cinema do mestre sueco. A despeito de sua fama como cineasta, Bergman se definia como um homem dos palcos. “Meu coração pertence ao teatro”, declarou pouco antes de sua morte, em 2007.

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Em sua encenação, o diretor argentino Daniel Veronese recupera o aspecto de obra de câmara que já estava delineado na criação matriz. Tudo se passa no interior de uma casa de campo, ambiente claustrofóbico em que as personagens sufocam em mágoas e angústias insolúveis. Eva (Maria Onetta) recebe a visita de sua mãe Charlote (Cristina Banegas). Elas não se viam havia sete anos. E o reencontro termina por despertar rancores que jaziam quietos.

Não se trai a densidade psicológica dos dramas de Bergman. Obviamente, a sombra onipresente do filme pode atrapalhar a fruição. Mas também oferece chances de descobrir lugares em que a presença viva dos atores ultrapassa qualquer forma mecânica de beleza.

A adaptação do reconhecido encenador de Buenos Aires não opera mudanças no enredo e faz apenas breves supressões para assegurar o ritmo da montagem. A diferença essencial está no lugar de onde passam a falar essas personagens. Cidades e particularidades da Europa continuam a ser referenciadas, tal como no original. Mas Veronese não escamoteia o temperamento latino.

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A contenção nórdica cede lugar ao desregramento. Tudo será dito não só em palavras, mas em gestos, em lágrimas, em corpos que se deixam cair no chão em abandono. É como se uma voz nos dissesse: Não nos livramos do melodrama no qual fomos forjados. O sofrimento nos evidencia tolos, ridículos, eternas crianças em busca de aceitação e afeto. Tal opção lembra as cores saturadas que Veronese já havia utilizado ao visitar os textos de Chekhov. Tudo o que era resignação no autor russo, tornava-se grito aberto nas versões do argentino.

Sem grandes inovações formais, Sonata de Outono surge como amostra evidente do apego do diretor aos atores e ao texto. Em cena, as palavras despontam claras e plenas de espanto. Como se nunca houvessem sido ditas ou ouvidas antes. Um apuro na interpretação que nos leva a encontrar certo tipo de verdade que só cabe na ficção. Uma possibilidade de compartilhar a dor do outro que nenhuma realidade pode oferecer. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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