Em tempos cada vez mais difíceis para o CD, nos quais o mp3 impera como forma de divulgação do trabalho de novos artistas, uma parcela seleta dos apreciadores da boa música ainda preferem o vinil. O bolachão, que chegou a deixar de ser fabricado no Brasil nos meados dos anos 1990, voltou às prensas em 2009, com a reabertura da Polysom, a única remanescente de todas as fábricas de LP do país.
Mas esse retorno não é só nostalgia. O mercado está em expansão e o número de novos adeptos do formato também está aumentando. Gary Day, baixista do cantor inglês Morrissey durante os anos 1990 e 2000, dá uma dica do porquê desse revival. “É muito mais divertido colocar a agulha nos grooves do vinil que colocar um CD no aparelho”, disse o músico em entrevista exclusiva ao Paraná Online.
Para Marcos Ramos Duarte, proprietário da Livraria Joaquim, uma das lojas especializadas na venda de LPs em Curitiba, a experiência com o vinil vai além da música. “Ouvir um disco de vinil é um ritual, não é só ouvir a música, é conhecer o conceito do álbum, é ter acesso as informações adicionais sobre a produção, a história, é apreciar o a capa, os encartes e tudo isto meio que ficou banalizado ou sem importância nas novas formas de mídia”, desabafa.
Qualidade de som
Há quem considere o som do vinil inferior ao do CD, porém, isso é facilmente explicado pela qualidade da prensagem a partir dos anos 80, quando a massificação do rock nacional criou uma verdadeira corrida do ouro às lojas de música. Além disso, para que o álbum não fosse onerado pelo material de fabricação, algumas gravadoras optaram por usar materiais de qualidade inferior, principalmente, em discos mais populares.
Entretanto, essa “verdade” cai por terra quando a questão envolve discos de música clássica, jazz e MPB fabricados até 1990. Até hoje, há quem veja a produção nacional de vinil com olhos desconfiados, porém, Duarte afirma o contrário. “A volta da Polysom foi um marco importante no mercado de vinil brasileiro, há uma melhora gradativa na qualidade dos discos produzidos e os preços estão, aos poucos, sendo mais competitivos”, disse.
Hiato
A partir de 1995, poucos LPs foram lançados no Brasil. Discos como “A Tempestade”, da Legião Urbana, de 1996, e “Hey Na na”, d’Os Paralamas do Sucesso, de 1998, já não tiveram edições originais de bolachão. Em 1999 surgiu a Polysom, criada por Nilton Rocha e José Rosa, foi adquirida pela Deckdisc em 2008, voltando a produção regular do vinil.
Atualmente, a maioria dos artistas brasileiros lançam seus trabalhos no formato digital, CD e em vinil. Nomes como Los Hermanos, Jorge Ben e Nação Zumbi tiveram suas obras revisitas no famoso formato 12 polegadas. Até mesmo o funkeiro Naldo teve uma edição em vinil de seu trabalho.
Acervo pessoal |
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Caixa com a coleção completa dos Smiths é uma das raridades que os colecionadores estão à caça. |
Outro formato que voltou à tona é o compacto, chamado em terras estrangeiras de 7 polegadas. Com o no máximo 4 músicas, o compacto se transformou em fetiche pelos colecionadores. “Muito do mercado existente hoje foi alimentado por colecionadores que nunca abandonaram esta mídia durante todos estes anos, a novidade é o crescente interesse dos mais novos no velho e bom bolachão”, defende Duarte.
Novos tempos
A chegada do mp3 e a consolidação dos players portáteis parecem não ter abalado a vivacidade do vinil, no entanto, a falta de equipamentos próprios para toc,ar o disco ainda é um entrave na comercialização do formato. “Um dos gargalos do mercado é a falta de aparelhos de som que toquem vinil, os novos que tem no mercado são muito caros e os usados sempre tem o problema da manutenção, mas apesar destes problemas todos, o mercado cresce e cresce muito”, comentou Duarte.
Dia após dia, o fetiche do vinil ganha novos adeptos. Não é difícil percorrer os sebos e lojas especializadas de Curitiba e ver adolescentes com bolachões e compactos nas mãos. “Uma boa compra de discos exige um bom garimpo, conhecer os melhores sebos, ampliar o conhecimento musical e da história da música em si, então fazer parte deste ciclo acaba sendo uma das partes mais recompensadoras”, avalia Marcos Hadlich, dono da Livraria Solaris, no Largo da Ordem.
A prova desse ressurgimento está nas feiras que acontecem com certa regularidade em Curitiba, como a do Canal da Música, deste sábado (15), que contará com expositores da região sul e sudeste. No entanto, quando se fala em divulgação massiva do trabalho, principalmente em termos de artistas independentes, a melhor solução encontrada ainda é o compartilhamento de arquivos digitais. Para o veterano músico de rockabilly Gary Day, “é importante para as bandas deixar o trabalho delas à mostra, portanto, então, isso não é algo ruim”.
Importação
Como existe apenas um fábrica no Brasil, muitos discos de artistas nacionais são prensados na República Checa, país em que o custo de produção é 30% inferior ao praticado em terras tupiniquins. “A única política é a de dificultar o acesso, seja com taxações abusivas, desembaraços alfandegários intermináveis ou pela precariedade dos sistemas de encomendas”, lamenta Hadlich.
A maioria dos discos novos vendidos no país ainda é importada, o que significa duas coisas: maior qualidade de som, mas um preço elevado. Segundo Duarte, os impostos representam 50% a 60% do preço final do produto. Outro agravante está distribuição dos discos, restrita basicamente ao eixo Rio-São Paulo. Com tantos entraves, Curitiba se transformou em um dos maiores polos de compra e venda de vinil no Brasil.
