Músicos, cantores e bailarinos sob chuva em frente da Prefeitura, pedindo pelo pagamento de salários atrasados. O ano musical encerra-se com uma nota triste para os artistas do Teatro Municipal. Não se trata apenas do atraso no pagamento, mas também da não renovação dos contratos para 2005. Em outras palavras, até segunda ordem, 2/3 da Sinfônica Municipal se foram. O que é lamentável se pensarmos nos bons momentos que o teatro rendeu nos últimos anos, com montagens de óperas como Lohengrin, Romeu e Julieta e Colombo, para ficar só em 2004.
A crise do Municipal não chega a surpreender. Há muito se fala na necessidade de se repensar o teatro como instituição. Se nos últimos quatro anos houve sensível crescimento artístico, que culminou em 2004, por outro lado os atrasos nos pagamentos, o aumento da dívida e, agora, a situação dos músicos mostram que em termos administrativos, há muito a se fazer.
Assim, o Municipal vira uma espécie de símbolo da realidade musical. Talento há de sobra. O que falta é estrutura de verdade também em outros espaços. Trazer um nome como o polonês Krystof Penderecki a São Paulo para reger seu Réquiem Polonês não é pouca coisa e só prova que a Osesp tem fôlego para crescer. Falta o projeto de transformá-la em organização social. Todas as datas-limite e promessas já venceram, mas, até agora, nenhuma novidade para dar uma cara institucional ao grupo, que tem situação administrativa frágil, não condizente com o alto nível artístico que representa. Ficou para 2005, esperamos.
Mas, em termos pontuais, o ano foi gordo para a ópera e a música erudita. Na área lírica, o ano começou em Manaus com o Crepúsculo de Wagner, feito sem precedentes na história dos nossos teatros (e, em 2005, teremos o Anel completo). Também do alemão, outra montagem: Lohengrin, no Municipal de São Paulo. Lá também ouvimos pela primeira vez no País o Romeu e Julieta de Gounod. Destaque também para o Schiavo, de Carlos Gomes, em Campinas, e para Carmen, de Belém. Além de apresentar novo repertório, as montagens deram espaço para uma nova geração de cantores brasileiros.
No campo sinfônico, além da Municipal e da Osesp, a boa nova foi a Sinfônica da USP, com qualidade musical e inteligência de programação que já viraram referência. Saindo da esfera pública, para as entidades privadas de concerto. Foi histórico o encontro de Nelson Freire e Martha Argerich, promovido pelo Mozarteum. Mas dá uma sensação boa saber que não foi o único: quem teve a chance de ver Les Arts Florissants com William Christie, trazidos pelo Cultura Artística, deve ter experimentado o orgulho de morar na capital musical do País.