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Inspiração: Copinha

Copinha é um elo perdido. Afinal, quantos conhecem bem o músico que assina a introdução de Chega de Saudade, que gravou discos com Paulinho da Viola, Chico Alves, Carmen Miranda, Mário Reis, Aracy de Almeida, Carlos Galhardo, Luiz Gonzaga e Cartola? Que teve um de seus raros álbuns com arranjos de Pixinguinha e foi escalado por Tom Jobim para deixar sua marca na estreia da bossa nova? Não há nada publicado sobre sua vida e ninguém lhe presta tributos, mas o filho de italianos Nicolino Copia, o Copinha, flautista, saxofonista, clarinetista e compositor morto em 1984, tem seu terreno bem demarcado na história.

Maiara Moraes, 32 anos, é uma jovem flautista criada em Florianópolis, nascida em Foz do Iguaçu e que vive em São Paulo há seis anos. Algumas tabelas pelo caminho a levaram a olhar para Copinha com a sensibilidade que ainda faltava. Uma pesquisa para mestrado da Unicamp mostrou primeiro quem era o raro flautista dos anos 30 e 40 que não tinha nas veias apenas a escola do choro. Eduardo Neves, outro representante de peso na flauta, era professor de Maiara e havia sido aluno do próprio Copa. “A história dele me intrigou. Ele deixou poucos álbuns e quase nada foi escrito, apesar de sua importância”, diz a instrumentista.

O primeiro álbum de Maiara começou a nascer assim, dos sopros de Copinha. Antes de fechar o conceito, decidiu trazer mais gente e pensou em outros compositores flautistas que faziam parte de sua formação. Virou então um disco metade para Copinha, com Saudade da Carolina, Será que é Isso?, Reconciliação e Amando Sempre; e a outra metade para Léa Freire (Maré), Debora Gurgel (que também é brilhante pianista, com Choro), Toninho Carrasqueira (Valsa pra Edi), mestre Eduardo Neves (Cruzada São Sebastião) e Henrique Albino (Mai Pinheiros!). Maiara aparece com um tema seu na bela melodia de Maracatu.

Ao pensar na formação de conjunto que usaria, sua gig, a instrumentista se viu diante de duas possibilidades mais visíveis. O choro era uma delas, a linguagem natural do instrumento que abraçaria até temas menos chorísticos, como Saudade de Carolina. E o jazz era a outra, a opção que poderia fazer mais justiça a um pensador criativo que evitou o estigma de um ritmo apenas. Ganhou a segunda, e, assim, Maiara optou por personalizar os poucos instrumentos que escolheu com a força dos músicos. Salomão Soares foi para o piano, Marcos Paiva para o contrabaixo e Pedro Henning assumiu a bateria, além da sua própria flauta no front. O clarinetista e claronista Jussan Cluxlei e o saxofonista tenor Cesar Roversi chegaram como reforços.

“A flauta já é muito vinculada ao choro”, diz Maiara. “Eu quis justamente fugir disso.” Ela justifica assim não só a liberdade que o jazz poderia dar aos temas como também a escolha dos autores. Altamiro Carrilho, um monumento à flauta brasileira, pode fazer falta, assim como Patápio Silva, mas talvez eles movimentassem o álbum para o lugar que ela queria evitar. Preferiu então, por exemplo, Henrique Albino, um jovem de Olinda, de 25 anos, que já pode ser considerado uma forte peça na renovação da música instrumental.

Aprisionados

A flauta e o choro, como a viola e a música caipira ou a sanfona e o baião, têm uma força de atração entre si que independe até mesmo das intenções de seus compositores. Algo como dizer que, no caso dos flautistas, toquem o que quiser que aquilo será sempre um choro. Maiara diz que não luta contra isso. “Cada instrumento carrega uma história, e nós não podemos renegar isso. Em vez de brigar contra essa natureza, podemos usá-la como referência”, diz.

O pouco que se sabe da vida do próprio Copinha reforça a tese de que a flauta já estava livre em suas mãos. Quando o chamou para gravar Chega de Saudade, em 1958, Tom Jobim revelou que o fazia justamente porque não queria nada que levasse a canção para a casa dos chorões. Copinha tinha o timbre e uma postura perfeitos.

A pouca presença de Copa mesmo no anedotário da música brasileira, para Maiara, é uma consequência mais de suas próprias atitudes do que de uma injustiça museológica. Copinha era um operário, e nunca esteve preocupado em desenvolver uma linguagem ou um repertório de impacto histórico. Começou no cinema mudo em 1924, tocou sax em banda de jazz e atendeu chamados onde quer que houvesse um cascalho que lhe pagasse os boletos. O tamanho que imaginou que tinha era menor do que o tamanho que Maiara comprova que ele, de fato, tem.

Maiara. Usou formação que a distanciasse do choro e a levasse mais para o jazz

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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