A música é o ponto de partida para a concepção de todo espetáculo do Grupo Corpo. É ela também uma das principais responsáveis por ditar a personalidade de cada balé. É por isso que, quando o público assiste à companhia, consegue ver as notas musicais ganhando movimento por meio dos bailarinos.
A partir de 21, coreografado por Rodrigo Pederneiras em 1992, o Corpo optou por usar apenas trilhas originais (a exceção foi Lecuona, em 2004). A música desse espetáculo é de Marco Antônio Guimarães, que já havia colaborado com a companhia em Uakti (1988), balé homônimo ao grupo criado por ele em 1978. Agora, Guimarães é o responsável pela composição de Dança Sinfônica, sua quinta contribuição para o grupo.
Em rara entrevista, Guimarães conta ao jornal O Estado de S.Paulo que já conhece a maneira de Rodrigo coreografar. Desta vez, no entanto, foi um pouco mais complexo. “O pessoal resolveu fazer algo diferente. Nunca tinha sido encomendada uma coisa gravada por uma sinfônica. Quando Paulo e Rodrigo me procuraram, já tinham conversado com o maestro (Fabio) Mechetti e a direção da Filarmônica (de Minas Gerais, que executa a composição).”
O fundador do Uakti afirma que se inspirou em toda a sua experiência para compor a música de Dança Sinfônica. Aluno da Escola de Música da Universidade Federal da Bahia nos anos 1960, teve aulas de composição com Ernst Widmer e, com Walter Smetak, aprendeu a criar os próprios instrumentos. “Ano que vem faz 50 anos que entrei na oficina do Smetak. Eu não sabia quem ele era e, quando entrei lá, não sabia que isso iria mudar minha vida.”
Depois da faculdade, Guimarães tocou violoncelo em sinfônicas durante 15 anos, passando pela (Osesp) recém recriada por Eleazar de Carvalho. “Para a trilha desse balé, peguei todo esse material. É o que o Rodrigo falou. Fui aos baús antigos, revi a vivência da sinfônica e peças que escrevi há mais tempo, com a experiência que tenho hoje.”
O outro balé comemorativo dos 40 anos, Suíte Branca, tem a trilha assinada por Samuel Rosa e o Skank. Embora tenha sido uma experiência nova, Rosa conta que o processo ocorreu sem muito esforço. As referências para a composição estão no “DNA da banda”, segundo o músico. “Tem, nessa trilha, tudo o que o Skank foi nesses mais de 20 anos, um pouco de psicodelia, o dub, que é a psicodelia jamaicana e a mistura com coisas mineiras.”
Liberdade, sempre. O único problema para o Skank foi encontrar o equilíbrio no excesso de autonomia que os irmãos Pederneiras deram, como fazem com todos os compositores. “Falavam ‘vai lá, cria à vontade’. Em um segundo momento, apontavam ‘isso funciona mais, isso menos'”, diz Rosa. “No começo, fomos um pouco afoitos demais. Paulo falou: ‘Não vou ter bailarino para isso’. Perguntei: ‘Por que, o elenco é pequeno?’ Ele respondeu: ‘Não, você vai cansar os caras. Precisa ter mais nuances’.”
Lenine, que contribuiu com a trilha de Breu (2007) e Triz (2013), também sentiu o peso e o privilégio da autonomia. “A liberdade opressora, sem briefing, é uma janela muito poderosa”, diz. “Para mim, é uma possibilidade de exercitar uma musica instrumental que raras vezes tenho a oportunidade de tocar. Foi incrível ver pela primeira vez minha música em três dimensões.”
Sobre as experiências, Lenine diz que foi um aprendizado. “Quando fiz Breu, tudo era novo. Com Triz, já tinha uma dimensão real do que poderia estimular a expressão daqueles corpos. O que não mudou foi a liberdade de fazer a música.” Por isso, ele é grato. “Nós, da música, temos um débito enorme com o Corpo. Durante anos, eles persistiram em acreditar na composição de trilhas originais.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.