Se Tick, Tick… Boom! trata da insegurança trazida pela idade, Na Pele toca em um assunto igualmente delicado: a descoberta da sexualidade e o conflito que isso pode provocar em confronto com os dogmas religiosos. “O espetáculo conta uma história de caráter emergencial, que não se pode esconder”, comenta o ator Diego Montez que, além de ser um dos protagonistas, foi um dos que mais batalharam pela produção da peça.

continua após a publicidade

Ele vive Jonas, líder de um grupo de estudantes de um internato católico. Popular, desejado pelas meninas, Jonas sustenta a figura do exemplo a ser seguido. Ele é apaixonado, no entanto, por Pedro (Mateus Ribeiro), rapaz sensível, que busca encontrar um caminho para revelar sua opção para a mãe. É obrigado também a lidar com insegurança de Jonas, que teme perder seu status se sua homossexualidade for descoberta.

continua após a publicidade

“Assisti, ao lado do produtor Ricardo Marques, a uma versão montada em 2013, em Nova York, mas não gostamos – aliás, nem os produtores pareceram gostar. Mesmo assim, percebemos que havia ali um texto com grande potencial”, conta o diretor do espetáculo, Léo Rommano. Desde então, ele e Marques tentaram de todos os modos conseguir viabilizar a produção nacional, mas não encontraram nenhum patrocinador. O motivo é o teor do espetáculo, que mostra um confronto de ideias entre religião e liberdade de opção sexual, tema ainda considerado tabu pela maioria dos apoiadores.

continua após a publicidade

A solução do problema foi arriscada, mas se revelou bem sucedida: o grupo inscreveu o projeto no Catarse, site de financiamento coletivo em que qualquer pessoa pode contribuir. O objetivo era alcançar pouco mais de R$ 62 mil, uma meta alta, mas, ao final, foram arrecadados mais de R$ 66 mil, o que garante sustentar um elenco de 17 atores e uma banda de seis músicos, além dos custos de manutenção, durante uma temporada de dois meses.

“Foi a melhor resposta que poderíamos esperar, pois comprovou que o assunto continua atual”, comenta Mateus Ribeiro que, ao lado de Diego Montez e outros membros do grupo, todos com imagem consolidada em grandes musicais, se entregaram a uma produção de baixo orçamento, mas de grande qualidade. Afinal, Bare (título original do espetáculo que estreou na Broadway) foi montado em diversas cidades americanas e de outros países, desde que estreou em 2000, em Los Angeles. Com texto de Jon Hartmere e melodia de Damon Intrabartolo, o musical é habilidoso ao apresentar os conflitos daqueles alunos a partir de uma montagem de Romeu e Julieta, de Shakespeare, texto que também trata de um amor proibido. “Ao longo desses cinco anos de espera, fiz pesquisas sobre identidade sexual e social, drogas e religião, que enriqueceram a encenação”, conta Rommano. “E, realizar agora esse projeto, dessa forma, é um ato de resistência, não apenas pela temática, mas pela oportunidade de realizar um projeto que foi tão recusado.”

Em sua concepção cênica, o diretor decidiu que todos os personagens, mesmo os mais discretos, teriam uma história particular, o que os individualiza. Assim, ganham destaque outros nomes como Vânia Canto, que tira o fôlego do espectador como Nadia, a inconformada irmã de Jonas. Ou Thuany Parente, que vive Eva, garota bonita e que engravida de maneira inesperada, trazendo outro assunto delicado à cena.

Na Pele abre espaço também para intérpretes mais experientes, como Marya Bravo que, no papel de Clara, mãe de Pedro, é capaz de arrancar lágrimas com seu solo; e Maria Bia, que vive com raro brilho Irmã Elza, a religiosa que dirige a montagem de Romeu e Julieta, tratando os alunos com uma linguagem absolutamente moderna e hilariante, arrancando as principais gargalhadas do espetáculo.

“Jonas vai de herói da escola à pária da sociedade, de uma forma que só é possível na estrutura social esquisita que vivemos no ensino médio. Com o espetáculo, queremos discutir temas como alienação, medo da rejeição, confusão de identidade sexual, bullying, preconceito, suicídio”, comenta Rommano.

E, assim como Tick, Tick… Boom!, Na Pele é fruto de produtores interessados em alimentar o circuito alternativo de São Paulo. Para isso, foi criada a 4ACT OFF, que promete espetáculos menores em tamanho, mas enormes em conteúdo.

NA PELE

Teatro Augusta

Rua Augusta, 943. Tel. 3231-2042. 4ª e 5ª, 21h. R$ 60.

Até 20/12. Estreia 31/10

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.