Nívea Maria tinha uma boa razão para querer o papel da humilde Maria José, em América: ter acabado de interpretar a sofisticada Corina, de Celebridade. Como todo ator, Nívea também queria fazer um personagem diferente daquele que ainda estava na memória do público. E é com essa variação que Nívea mantém a empolgação depois de 42 anos de carreira. Mas, além disso, a personagem da atriz também ajuda um bocado. Na trama, Mazé, como é conhecida, é mãe do peão Tião, de Murilo Benício, e do ambicioso Geninho, de Marcelo Novaes, por quem foi enganada para vender as terras onde vive. "Esse drama como mãe vai fazer de Mazé, até então frágil e tímida, uma mulher forte", adianta, com um largo sorriso.

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Nívea acha que Mazé vem numa leva de personagens mais densas e interessantes que passou a fazer. Isso depois de muitos anos vivendo o que define como "hiato profissional", em que interpretava apenas papéis superficiais – essa mudança ficou bem-caracterizada com a amargurada e ressentida Maria, de A Casa das Sete Mulheres. "Eu vinha fazendo personagens amorfos e Maria me permitiu recuperar o meu prazer de criar", conta. A frase não carrega, no entanto, qualquer ranço de insatisfação. Mesmo quando não está plenamente realizada com um personagem, Nívea faz questão de encontrar alguns pontos positivos no trabalho.

Aos 58 anos, a atriz que começou a carreira aos 16 parece não se preocupar com o envelhecimento e com os reflexos disso no seu trabalho. "A idade está aí mesmo. A dramaturgia não vive apenas de mocinhas e mocinhos. Sempre vão ter as mães, avós…", argumenta. Nívea também lida bem com as mudanças do seu corpo e, no caso de Mazé, acredita que as formas arredondadas contribuíram para o visual da personagem. "Confesso que não percebi que tinha engordado. Mas isso faz da Mazé uma mãe mais aconchegante", diverte-se.

P – Seu último papel na tevê foi a grã-fina Corina de Celebridade. Você se identifica mais com ela ou com a humilde Mazé?

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R – O universo da Mazé é muito mais próximo de mim. Sou uma pessoa de hábitos e vida simples, uma operária da minha profissão. Vim de uma família de classe média, meu pai era advogado, mas minha mãe sempre foi dona de casa. Era uma pessoa humilde, que passou a vida cuidando do lar e dos filhos. Por isso, é muito mais fácil e confortável para mim fazer uma personagem com um jeito simples do que tipos sofisticados.

P – O que, exatamente, mais chama a sua atenção na Mazé?

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R – O despojamento e a pureza de sentimentos. Ela é uma personagem muito humana e verdadeira, que não sofre nenhuma influência da modernidade. Ainda hoje muitas pessoas vivem dessa forma, nessa espécie de redoma de proteção contra as coisas duras que acontecem no mundo. Na verdade, acho que elas são mais felizes, pois são menos calculistas e seus problemas são menores. Os sentimentos da Mazé são instintivos, puros. Ter de transmitir essa verdade e essa simplicidade é um ótimo exercício como atriz, ainda mais depois de ter feito Celebridade, que mostrava um universo de máscaras e disfarces.

P – Para você é difícil deixar a vaidade de lado para interpretar a Mazé?

R – As pessoas acham que as atrizes são muito vaidosas e que têm de estar sempre maquiadas e com o cabelo arrumado. Mas estou em um momento muito despojado da minha vida. Estou reavaliando conceitos, valores e me preocupando muito mais com os outros. Não no sentido da bondade, mas quero compreender as necessidades das pessoas e como elas lidam com esse mundo tão tumultuado. Através dessa personagem estou aprendendo a valorizar as coisas simples da vida e a me relacionar com o tempo de uma forma mais contemplativa. Por isso, faço a Mazé com tanta tranqüilidade. Sei que ela é uma mulher que passa despercebida no meio da multidão, mas isso não me incomoda. Não tenho pudor em relação a uma personagem. Esse meu momento pessoal se encaixa muito bem com esse papel.

P – Você gostaria que a feminilidade da Mazé também fosse colocada em evidência através de um relacionamento amoroso?

R – Eu adoraria que a Glória Perez explorasse esse lado. Seria mais um elemento para a personagem e uma forma de mostrar para as milhões de Mazés que existem por aí que, apesar delas serem mães e donas de casa, também podem ter um grande amor. A Mazé não tem a exuberância da Neuta, por exemplo, mas é uma mulher forte e, com certeza, atrai os homens.

P – Na sua opinião, as novelas têm realmente uma função social?

R – Claro que sim. Apesar de serem uma forma de lazer, as novelas conseguem se infiltrar na sociedade e contribuir, de alguma forma, para a sua melhora. Percebo claramente que, a cada trabalho que faço, consigo provocar algum tipo de interferência no cotidiano das pessoas e, assim, gerar reflexão. Essa é justamente a minha única vaidade. Não há nada mais gratificante do que, depois de anos, alguém chegar para você e dizer que lembra da atitude de determinada personagem, de algo que ela disse e contar como isso influenciou no seu dia-a-dia.

P – Você constantemente emenda trabalhos na tevê. Qual a sua motivação para se dedicar tanto ao veículo?

R – É a continuidade de trabalho que a tevê me oferece. O teatro não me faz tantas ofertas e o cinema… Continuo sem fazer. Eu não perco o prazer de fazer tevê, pois trabalhar nela é sempre positivo. Às vezes, você faz um grande personagem em uma obra que não faz tanto sucesso. Mas, em outros momentos, você faz um papel fraco em uma novela de grande sucesso, que vale a pena ter no currículo. Ou seja, você sempre sai ganhando. Hoje em dia, não faço mais tevê para ser vista, para divulgar o meu trabalho. Mas não posso ignorar que através dela estou conseguindo conquistar novas gerações, que não conheceram o início da minha carreira. 

Movida pela força do destino

Nívea Maria queria mesmo era ser bailarina. E chegou a se preparar para tentar ingressar no corpo de baile do Teatro Municipal de São Paulo. Mas a vida, simplesmente, apontou outro rumo. Aos 13 anos, fez alguns comerciais e aos 16 foi chamada para participar dos cinco últimos capítulos de A Moça que Veio de Longe, na extinta TV Excelsior. No ano seguinte, em 1964, fez a novela Melodia Fatal e pronto: não largou mais a profissão. Em 1971, mudou-se para o Rio e, um ano depois, estreou na Globo, emissora na qual está até hoje em O Primeiro Amor.

Em 1975, Nívea protagonizou A Moreninha, segundo ela, um dos trabalhos mais marcantes. Sua personagem, Carolina, tornou-se ícone de heroína romântica e a atriz garante que ainda é reconhecida pelo público por esse trabalho. Outra novela que também deixou boas lembranças para Nívea foi Maria, Maria. Ela interpretava as gêmeas Maria Alves e Maria Dusá. A primeira, meiga, e a outra, orgulhosa. "Não fiz nenhuma Helena, mas fiz duas Marias de Manoel Carlos", frisa.

Nívea também é dona do restaurante Dois em Cena, no Shopping Rio Sul, zona sul do Rio. A idéia de montar o restaurante foi do amigo André Nunes. O negócio já existe há quatro anos e, recentemente, Nívea e seus sócios André e suas duas filhas, Viviane e Vanessa, abriram uma filial no Centro Cultural Telemar, no Flamengo.